A América caminha para a direita


Há algumas semanas, vimos uma guinada à direita em vários países europeus.

Na França, o partido de Marine Le Pen derrotou o partido de Emmanuel Macron, conquistando 34% dos votos, o que fez o presidente francês convocar eleições antecipadas.

O primeiro-ministro da Bélgica, Alexander De Croo, renunciou depois de uma derrota acachapante para a direita belga, enquanto a coalização governista da Alemanha sofreu uma dura perda para os conservadores, com o partido Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla em alemão) ficando sem segundo lugar.

Na Irlanda, vários candidatos anti-imigração foram eleitos, e na Holanda, o partido de Geert Wilders, principal líder da direita holandesa, conquistou vários assentos no parlamento, tornando-se o segundo maior partido.

Na Áustria, o partido de direita FPÖ dobrou seu número de parlamentares e é agora o maior do país, ao passo que na Espanha, o partido de direita Vox se tornou o terceiro maior partido, com cerca de 10% dos votos.

Na América do Sul, embora 9 dos 12 países do continente ainda estejam sob governos de esquerda, temos visto nos últimos anos uma crescente tendência para a direita.

A última edição da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC, na sigla em inglês) demonstrou a força do movimento conservador na região e se destacou pela presença de autoridades ilustres, como o presidente da Argentina, Javier Milei, e o chefe da segurança pública de El Salvador, Gustavo Villatoro Nunes.

Tudo isso é interessante e relevante à luz do que discutimos no último post.

Porém são os Estados Unidos que devem absorver nossa atenção, onde os conservadores de direita estão trabalhando duro para recuperar as rédeas do governo naquela que possivelmente será a eleição presidencial mais decisiva da história.

O papel dos Estados Unidos no tempo do fim

A Bíblia prediz que o mundo enfrentará uma terrível crise pouco antes da volta de Jesus (Daniel 12:1; Lucas 21:25-28) e que os Estados Unidos terão o protagonismo sobre como solucioná-la (Apocalipse 13:11-17).

Em resumo, o cenário é o seguinte.

Igrejas americanas influentes se unirão com base em doutrinas e valores em comum e, em resposta às terríveis crises que ameaçam o país e a humanidade, trabalharão em uníssono para influenciar o governo a impor seus decretos e apoiar suas instituições.

Quando seus objetivos forem alcançados, a América protestante terá renunciado aos seus princípios fundadores e formará uma imagem à primeira besta – o papado (Apocalipse 13:14).

Uma imagem à besta significa fazer "com que a terra e os seus habitantes adorem a primeira besta, cuja ferida mortal fora curada". Para isso, a segunda besta – os Estados Unidos – devem exercer toda a autoridade da primeira na sua presença (verso 12).

Uma imagem à besta nos Estados Unidos será, portanto, uma identificação deste país com o espírito do papado, uma ordem social que funcionará segundo seus critérios e princípios de organização.

Como Marvin Moore observou, o problema com a filosofia política da direita cristã, que une evangélicos e católicos na mesma causa, não está com as intenções deles neste momento, mas com o sistema político-religioso que estão determinados a estabelecer e com o uso desse sistema depois de ter sido estabelecido.

À primeira vista, parece difícil imaginar como isso poderá levar a América a abandonar o poder duradouro de suas instituições para favorecer uma forma de governo diametralmente oposta como a do papado.

Por certo, os Estados Unidos não renunciarão oficialmente aos seus valores. A Constituição e a Declaração de Direitos não serão revogadas, nem tampouco a Declaração de Independência. E as corporações religiosas e organizações conservadoras mais influentes da América continuarão a exaltar seus princípios fundadores, exatamente como têm feito agora.

A questão é que um ato legislativo de cunho religioso em benefício do papado provavelmente virá sob a forma de leis destinadas a lidar com crises sociais e sob o pretexto de resgatar a herança moral e cristã da sociedade americana, de maneira a pôr um fim às calamidades e garantir as bênçãos de Deus sobre a nação.

Essa é, sem dúvida, uma estratégia mais palatável do que uma legislação aberta e rigidamente religiosa que determine como uma pessoa deve servir e adorar a Deus, e será tão bem-sucedida em seu propósito aparentemente nobre que servirá de modelo para as demais nações do mundo.

Em Profecias Surpreendentes, Herbert E. Douglass observou com notável percepção:

A qualquer momento, a maioria nos Estados Unidos da América perceberá que o American way [o modo de vida americano] de hoje deve retornar ao American way de um século atrás. Repugnância contra a decadência se tornará um tema nacional. A convergência de desastres econômicos e naturais incendiará os ânimos do público, em geral, a ponto de clamarem em comum acordo: 'Algo tem que ser feito!'

Douglass escreveu essas palavras em 2007. Desde então, a decadência dos Estados Unidos se tornou proverbial em todo o mundo, da economia aos costumes.

Sim, algo tem que ser feito, mesmo que isso exija o fim da separação entre igreja e estado como a temos conhecido nos Estados Unidos.

Vamos dar uma olhada nas últimas iniciativas do conservadorismo americano e, assim, identificar como suas ações estão preparando o caminho para o cumprimento final da profecia.

Lembre-se, no entanto, que ao falar da direita conservadora não estou automaticamente justificando ou endossando, em qualquer medida, grau ou aspecto, a chamada esquerda progressista.

Na verdade, pode-se dizer da direita e da esquerda contemporâneas o que foi dito sobre os reis do Norte e do Sul em Daniel 11:27:

Também estes dois reis se empenharão em fazer o mal e a uma só mesa falarão mentiras; porém isso não prosperará, porque o fim virá no tempo determinado.

O Project 2025

O Projeto de Transição Presidencial 2025 – ou Project 2025 – é, de acordo com o próprio documento, "o esforço unificado do movimento conservador para estar pronto para que a próxima administração conservadora assuma o governo às 00h00 de 20 de janeiro de 2025".

Elaborado pela Heritage Foundation, um dos maiores e mais influentes think tanks (laboratório de ideias) dos Estados Unidos, o Project 2025 se baseia no projeto Mandate for Leadership, uma série de publicações que oferecem propostas abrangentes de políticas conservadoras a serem implementadas pelo governo caso um candidato republicano vença a eleição presidencial.

A primeira edição do Mandate for Leadership foi publicada em janeiro de 1981, no mesmo mês em que Ronald Reagan assumiu a presidência. Tratava-se de um manual de governo de 20 volumes e 3 mil páginas, com mais de 2 mil políticas conservadoras destinadas a reformar o governo federal, e "até o final daquele ano, mais de 60% de suas propostas haviam sido transformadas em políticas públicas".

Dez edições do Mandate for Leadership foram publicadas desde então, e durante a administração Trump, dois terços das propostas contidas no documento da Heritage foram adotadas em apenas um ano.

O Project 2025 tem mais de 900 páginas, 30 capítulos que abordam vários aspectos do governo americano, e sua elaboração contou com o apoio de 400 acadêmicos e especialistas em política e 70 organizações conservadoras.

O problema nas principais propostas

Há muitas coisas boas neste documento, e as recomendações elaboradas por seus autores – as quais abrangem quatro frentes amplas que, segundo eles, decidirão o futuro dos Estados Unidos – se alinham com uma perspectiva mais bíblica e conservadora com a qual eu particularmente simpatizo.

Essas quatro frentes são, nas palavras do documento,

  1. Restaurar a família como o ponto central da vida americana e proteger nossos filhos.
  2. Desmantelar o estado administrativo e devolver a autogovernança ao povo americano.
  3. Defender a soberania, as fronteiras e a hospitalidade de nossa nação contra ameaças globais.
  4. Garantir nossos direitos individuais, concedidos por Deus, de viver livremente – o que nossa Constituição chama de "as Bênçãos da Liberdade".

Nenhum cristão discordará, naturalmente, da importância e urgência de reforçar o papel da família tradicional em um momento em que as várias ramificações da esquerda estão determinadas a destruir esta sagrada instituição.

Eu pessoalmente sou a favor da redução do tamanho e do poder da burocracia federal, e nenhum país que preze pela segurança, prosperidade e soberania de seu povo pode admitir uma política de fronteiras abertas.

E quem dentre nós não reconhece que é dever daqueles que nos representam garantir que cada cidadão desfrute livremente os direitos individuais concedidos por Deus?

O problema, a princípio, não tem a ver com as propostas em si, mas com o caminho para implementá-las. E como o meio é a mensagem, não é difícil identificar no texto do Project 2025 o tom imperativo e vigoroso que se espera encontrar em um plano de governo baseado na união entre igreja e estado.

Considere, por exemplo, as seguintes passagens:

  • "A pornografia deve ser proibida.... E as empresas de telecomunicações e de tecnologia que facilitam sua disseminação devem ser fechadas."
  • "Os estados, as cidades e condados, os conselhos escolares, os líderes sindicais, os diretores e professores que discordarem [da primazia dos pais na educação de seus filhos] devem ser imediatamente excluídos dos fundos federais."
  • "A solução para todos os problemas acima [as ameaças internas e externas aos Estados Unidos] não é modificar este ou aquele programa do governo, substituir este ou aquele burocrata.... Nós os resolvemos... arrancando as árvores – raiz e ramos."

Veja, não sou a favor da pornografia, evidentemente! Mas simplesmente proibi-la ou fechar as empresas que facilitam sua disseminação não resolverá o problema.

O direito de escolha dos pais quanto à educação dos filhos deve ser reconhecido pelo que ele é, um direito. No entanto, punir os que discordam certamente não beneficiará as famílias, nem tampouco a causa da liberdade.

E o uso da força contra qualquer ameaça por parte de um poder executivo mais robusto (advogado ao longo do documento em contradição à sua defesa de um governo limitado) pode, eventualmente, se voltar contra nós.

Nesse caso, as proteções constitucionais poderiam ser suspensas para um determinado grupo de pessoas consideradas de risco, sob a justificativa de manter a segurança e o bem-estar da sociedade civil.

Isso aconteceu com os americanos de origem japonesa depois do ataque a Pearl Harbor, com os de origem muçulmana durante a Guerra ao Terror e com todos aqueles que recusaram submeter-se às regras excruciantes das políticas sanitárias no decurso da Covid-19.

O perigo de cristianizar o estado

Por mais sinceros e bem-intencionados que sejam, os conservadores de direita que acreditam que cristianizar os Estados Unidos é a solução para tornar o país melhor deveriam reconsiderar sua estratégia, pois não somente a igreja e o estado pagarão caro, mas as pessoas, individualmente.

No tempo de Cristo, o Império Romano era repleto de corrupção, violência e práticas que a sociedade moderna considera reprováveis.

A escravidão era amplamente difundida e socialmente aceita, os combates mortais entre gladiadores serviam de entretenimento para as massas, o estupro e o assédio sexual eram crimes comuns, muitas vezes sem punição para os agressores, e o infanticídio era uma prática considerada aceitável e até mesmo legal em determinadas circunstâncias.

Mas nem Cristo nem os apóstolos trabalharam para mudar as leis e práticas romanas pela aquisição do aparelho estatal romano.

Foi o próprio Cristo quem estabeleceu a distinção, quem separou com um único traço os regimes romano e cristão ao proferir as palavras que sintetizam o princípio que deve orientar Seus seguidores:

"O meu reino não é deste mundo" (João 18:36), "Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus" (Lucas 20:25), e ainda, "Os reis dos povos dominam sobre eles, e os que exercem autoridade são chamados benfeitores. Mas vós não sois assim; pelo contrário, o maior entre vós seja como o menor; e aquele que dirige seja como o que serve" (Lucas 22:25 e 26).

Essas declarações implicam uma ordem inteiramente nova, um reino onde, nas palavras de Joseph Bernhart, "a salvação não dependia nem da forma política nem da potência do Estado, mas da decisão moral".

Para Cristo, o evangelho é liberdade e livre escolha, não obrigação ou coerção; é apelo às consciências, não às leis; é conquista de mentes e corações, não de governos e sociedades inteiras.

Ao apartar-se do poder do estado sem, contudo, negar as prerrogativas de sua jurisdição, Cristo recusou aceitar, sob qualquer arrazoado, os métodos e fundamentos do poder imperial para a promoção de Seu reino.

No evangelismo bíblico genuíno, que busca ganhar pessoas para Cristo, cada um é livre para escolher tornar-se ou não um cristão.

Mas em uma nação que está sendo moldada em uma sociedade cristã governada pela lei de Deus, não há liberdade nem livre escolha, e os que pensam de maneira diferente mais cedo ou mais tarde sentirão na pele o que significa viver sob a onipotência da maioria.

O reconhecimento do "Dia do Senhor"

Esse fato nos leva a outro ponto interessante e preocupante no texto do Project 2025.

Ele menciona que "Deus designou o sábado como um dia de descanso e, até recentemente, a tradição judaico-cristã procurava honrar este mandamento por meio da [note, por favor] regulamentação moral e legal do trabalho nesse dia".

O documento argumenta que "um dia comum de descanso permite que famílias e comunidades, e não indivíduos atomizados, desfrutem juntas de momentos de lazer e proporciona a todos um ritmo de vida mais saudável".

O texto prossegue dizendo que "o Congresso deveria encorajar o descanso comunitário alterando a Fair Labor Standards Act (FLSA) de modo a exigir que os trabalhadores recebam uma hora e meia pelas horas trabalhadas no sábado".

A FLSA é uma lei federal que estabelece padrões mínimos para salário, horas extras e condições de trabalho.

No caso das horas extras, a lei exige que os empregadores paguem aos seus funcionários uma taxa de hora e meia por todas as horas trabalhas além das 40 horas semanais, ou após 8 horas por dia para alguns empregados.

Assim, o Project 2025 defende a ideia de que a lei federal sobre padrões trabalhistas justos deveria incluir a garantia de uma continuidade razoável da tradição judaico-cristã no que tange ao sábado, "principalmente para que as pessoas possam adorar e honrar a Deus e, em segundo lugar, ter momentos de descanso comum com suas famílias e comunidades".

Acionar o Congresso para favorecer um dia de descanso inerentemente religioso já é, em si, um grande problema. Mas observe que não se trata do sábado do sétimo dia, pois o documento diz explicitamente que o dia de sábado ou de descanso comunitário reconhecido como tal é "por padrão o domingo"!

O Congresso jamais deveria legislar sobre um dia de descanso, mesmo que se tratasse do sábado do sétimo dia. Contudo, a proposta de que o legislativo "deveria encorajar o descanso comunitário" no primeiro dia da semana torna as coisas ainda piores, visto que o domingo não é o dia do Senhor, mas a marca de autoridade de Roma.

Se bem que o texto também contemple "empregadores que sinceramente observam outro período sabático (por exemplo, do pôr do sol de sexta-feira ao pôr do sol de sábado)", o dia reconhecido como o "dia comum de descanso" é "por padrão o domingo" e, portanto, ele tem precedência sobre todos os demais.

E por isso a tolerância para com aqueles que não observam o domingo poderá ser suspensa ou deixar de existir em qualquer caso que ameace "a ordem e a justiça da sociedade civil", as quais "os cristãos individualmente, e a igreja corporativamente", têm a responsabilidade de manter.

Um detalhe digno de nota é que o Project 2025 incluiu sutilmente a questão do domingo entre suas muitas propostas para um governo conservador da mesma forma que a Laudato Si' fez em suas recomendações aos políticos, governantes e legisladores de todo o mundo sobre como combater as mudanças climáticas.

A exibição dos Dez Mandamentos em espaços públicos

Vamos examinar brevemente o problema da observância legal do domingo abordando outra iniciativa conservadora que reforça nossas preocupações e que reflete o pensamento contido nas propostas do Project 2025.

Recentemente, o governador da Louisiana, Jeff Landry, assinou um projeto de lei que determina a exibição dos Dez Mandamentos nas escolas públicas, desde o ensino fundamental até o universitário. A decisão torna o estado da Louisiana o primeiro na América a ter essa exigência.

A nova lei obriga a exibição de um pôster com os Dez Mandamentos em "fonte grande e de fácil leitura" e deve incluir uma "declaração de contexto" de quatro parágrafos descrevendo como os mandamentos "foram uma parte proeminente da educação pública americana por quase três séculos".

"Se quisermos respeitar o estado de direito, temos que começar pelo legislador original, que foi Moisés", disse Landry em um evento de assinatura do projeto de lei.

O governador justificou a aprovação da lei em um post no X em 21 de junho (a ênfase é minha):

Em todo o país, o crime está disparando, a saúde mental está em declínio e nosso sistema educacional está falhando com nossos filhos. Colocar os Dez Mandamentos em nossas salas de aula públicas é um passo na direção certa para restaurar nossa moral e nossos valores.

Donald Trump, que apenas algumas semanas depois declarou não saber nada a respeito do Project 2025 e que "algumas das coisas que eles estão dizendo" não são razoáveis, elogiou a medida no Truth Social, acrescentando que "esse pode ser, de fato, o primeiro grande passo para o renascimento da religião em nosso país, o que é desesperadamente necessário".

O texto da lei foi claramente redigido tendo em vista os desafios legais quanto à sua constitucionalidade e, assim, é bastante revelador sobre como uma lei dominical nacional poderia ser aprovada com base nos mesmos argumentos.

A lei observa que "a Suprema Corte dos Estados Unidos reconheceu que é permitido exibir os Dez Mandamentos nas propriedades do governo em Van Orden v. Perry", um caso de 2005 em que Thomas Van Orden processou o Texas sob a alegação de que um monumento aos Dez Mandamentos no terreno do edifício do Capitólio do estado representava um endosso inconstitucional do governo à religião.

O tribunal distrital e o Tribunal de Apelações do Quinto Circuito decidiram a favor do Texas, explicando em seu parecer que o monumento [note] "destinava-se a um propósito secular válido".

O caso foi para a Suprema Corte e, numa decisão de 5 a 4, o tribunal decidiu a favor do estado. A corte considerou "o monumento do Texas [note novamente] parte da tradição nacional que reconhece o significado histórico dos Dez Mandamentos" e, por isso, apesar de seu cunho religioso, "não entra em conflito com a cláusula do não-estabelecimento".

Os cinco juízes favoráveis ao Texas foram William Rehnquist (luterano), Antonin Scalia (católico), Anthony Kennedy (católico), Clarence Thomas (católico) e Stephen Breyer (judeu).

A lei da Louisiana declara que "a intenção do Legislativo é aplicar a decisão estabelecida pela Suprema Corte" em Van Orden v. Perry, "a fim de dar continuidade à rica tradição e garantir que os alunos de nossas escolas públicas possam entender e apreciar os documentos fundadores de nosso governo estadual e nacional".

A lei também menciona outro caso semelhante, de 2019, em que a Suprema Corte reconheceu que os Dez Mandamentos "têm significado histórico como um dos fundamentos de nosso sistema jurídico" e decidiu que sua exibição em propriedade pública pode ter "significado histórico" e representar um "patrimônio cultural comum".

A argumentação de que os Dez Mandamentos são "uma parte proeminente da educação pública americana", o esteio original do "estado de direito", "um dos fundamentos" do sistema jurídico americano e "patrimônio cultural comum" esconde o fato de ainda tratar-se de um assunto religioso e abre o precedente para que observâncias religiosas possam ser impostas pelas leis civis em nome do bem comum.

Argumentos semelhantes podem ser usados para aprovar uma legislação que reconheça o domingo como um dia de interesse público e, nesse contexto, é significativo que o g1 tenha noticiado a decisão do estado da Louisiana reproduzindo os Dez Mandamentos tal como aparecem no Catecismo Romano!

No fim das contas, é disso que se trata quando falamos de crenças religiosas transformadas em políticas públicas.

Se prevalecer nos Estados Unidos o princípio segundo o qual a igreja pode empregar ou dirigir o poder do estado para aprovar leis religiosas sob a alegação de garantir o interesse público, não há dúvida de que estará aberto o caminho para que Roma restabeleça seu poder e recupere a supremacia perdida.

Um assunto da mais séria importância

Alguns dias depois da aprovação da nova lei da Louisiana, Dan Patrick, vice-governador do Texas, publicou no X:

O Texas TERIA sido e DEVERIA ter sido o primeiro estado do país a colocar os 10 Mandamentos de volta em nossas escolas.

Ele observou que o senado do Texas aprovou um projeto de lei nesse sentido na última sessão, mas a medida não chegou a ser votada na câmara dentro do prazo.

Patrick prometeu que aprovará o projeto de lei, o que, segundo ele, "trará de volta essa tradição histórica de reconhecimento do patrimônio americano e lembrará os estudantes de todo o Texas da importância da base fundamental da lei americana e do Texas: os Dez Mandamentos".

Esse esforço para reintroduzir uma legislação que exige a exibição do Decálogo nas escolas públicas texanas ocorre na esteira da nova lei da Louisiana e num momento em que os republicanos, com o forte apoio de pastores evangélicos influentes, estão determinados a reassumir o destino do país.

Jeff Landry disse que assinou o projeto de lei da Louisiana tendo em vista o reavivamento moral do estado.

Mas esse reavivamento, além de depender exclusivamente do poder civil, reconhece um dia de descanso que nem Cristo nem os apóstolos jamais instituíram.

E isso tem sérias implicações. Porque se a direita cristã vê os Dez Mandamentos como "patrimônio americano" e "base fundamental da lei americana", então o domingo, que é parte inseparável desse patrimônio, será visto sob a mesma perspectiva e com o mesmo zelo e favor.

Essa é uma questão de interesse nacional, pois afeta os princípios da Constituição americana e a correta distinção entre leis morais e civis.

Afeta também cada cidadão americano em seu dever de proteger o país da interferência mútua entre igreja e estado, na medida em que é ou não capaz de reconhecer, nas palavras de A. T. Jones, "que aquele que permite qualquer legislação em nome da religião ou de observâncias religiosas, mesmo que creia nelas, está renunciando à sua própria liberdade religiosa".

Dois exemplos representativos

Considere, por exemplo, o parecer favorável da Suprema Corte a Gerald Groff, um cristão e funcionário dos correios que se recusou a trabalhar aos domingos depois que o serviço postal firmou um acordo com a Amazon para a entrega de encomendas nesse dia.

Groff foi demitido em 2019, após sofrer medidas disciplinares por não cumprir seus turnos. Ele então processou o serviço postal em um tribunal federal, alegando que a empresa violou o Título VII da Lei de Direitos Civis de 1964, que proíbe a discriminação com base em religião.

Um tribunal distrital federal decidiu a favor da empresa e um painel dividido de juízes do Tribunal de Apelações dos EUA para o 3º Circuito confirmou a decisão, concluindo que a acomodação solicitada para práticas religiosas representaria uma dificuldade indevida para a companhia.

Mas em uma decisão unânime, a Suprema Corte rejeitou o parecer do tribunal de primeira instância contra o funcionário dos correios, e devolveu o caso para outros procedimentos legais.

Em outro recurso sob o Título VII, apresentado por Darrell Patterson, ex-funcionário da rede de farmácias Walgreens e adventista do sétimo dia, o 11º Tribunal de Apelações do Circuito dos EUA deu parecer favorável à empresa, sob o argumento de que ela havia feito vários esforços para acomodar as necessidades religiosas de Patterson e não era obrigada a garantir que ele não trabalhasse aos sábados.

Patterson recorreu à Suprema Corte, alegando que uma acomodação religiosa razoável exige que os empregadores eliminem completamente qualquer conflito entre o trabalho e as necessidades religiosas, e que os tribunais inferiores estão divididos sobre a questão.

Os juízes, no entanto, se recusaram a revisar a decisão do Tribunal de Apelações, concluindo que a solicitação de Patterson para não trabalhar aos sábados prejudicava a Walgreens.

O duplo padrão da Suprema Corte em dois casos semelhantes envolvendo o Título VII ilustra o duplo problema que uma lei dominical nacional representará em matéria de consciência; ela não é só antiamericana em seu caráter, mas também anticristã ao não garantir proteção igual a todas as pessoas no gozo de seus direitos religiosos e civis.

O que podemos concluir?

Tudo indica que a América caminha em direção a um governo mais bíblico e conservador, mas isso não significa boas notícias para os defensores da liberdade.

Eu creio nos Dez Mandamentos e nos valores bíblicos, porém creio que o sétimo dia é o sábado do Senhor, o qual deve ser observado pela fé em Jesus, não por imposição de leis humanas.

Não tenho nenhum problema com estadistas que temem a Deus. Eles estão entre os instrumentos do Céu para conter a onda do mal que ameaça destruir as famílias e a sociedade.

O erro é cruzar a linha que separa igreja e estado e violar os princípios da liberdade religiosa, privilegiando a observância de um dia.

Se olharmos para os valores tradicionais conservadores do protestantismo americano, é fácil perceber que, por muito tempo, ele favoreceu a observância do domingo, em detrimento da liberdade de consciência.

E podemos estar certos de que a demanda pela guarda compulsória do domingo em nossos dias não será iniciada principalmente por governadores e legisladores, sejam eles republicanos ou democratas.

Quando o tempo de crise finalmente chegar e o domingo for visto como uma parte importante da solução para os múltiplos problemas que têm assolado a sociedade americana e a humanidade, "governantes e legisladores, a fim de conseguir o favor do público, cederão", nas palavras de Ellen G. White,

ao pedido popular de uma lei que imponha a observância do domingo. A liberdade de consciência, obtida a tão elevado preço de sacrifício, não mais será respeitada. No conflito prestes a se desencadear, veremos exemplificadas as palavras do profeta: 'O dragão irou-se contra a mulher, e foi fazer guerra ao resto da sua semente, os que guardam os mandamentos de Deus, e têm o testemunho de Jesus Cristo.' Apocalipse 12:17.

Estamos vivendo "nos últimos dias" (2 Timóteo 3:1). Uma grande crise está por vir.

Os conservadores cristãos que estão engajados numa causa perdida (por recorrerem ao braço secular e exaltarem um dia que a Palavra de Deus não reconhece) compreendem isso, pelo menos em parte, e estão se mobilizando e se unindo em jejuns e oração.

Não está na hora de o povo de Deus, que conhece Sua Palavra, fazer o mesmo, por amor à verdade e às almas a perecer nas trevas do engano?

Eu acredito que sim.


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1 Comentários

  1. A aprovação da Lei que deu o direito dos dois Estados americanos de colocar os Dez Mandamentos na rede pública escolar,abrirá precedentes para a aprovação do decreto dominical for apresentado.

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