Qual país é considerado exemplar na prática da doutrina social católica?


De volta de uma viagem a Pequim, o bispo católico e chanceler da Pontifícia Academia de Ciências do Vaticano, mons. Marcelo Sánchez Sorondo, não poupou elogios ao regime chinês.

Claro, não foi a primeira vez que ele fez isso. Em fevereiro de 2017, em uma reunião internacional sobre tráfico de órgãos, Sorondo defendeu veementemente Pequim contra a acusação de que médicos chineses realizam transplantes forçados em prisioneiros e condenados à morte.

Em sua mais recente demonstração de lisonja, no entanto, Sorondo foi além. Ele exaltou a China como um país onde o "bem comum" é o valor primário, onde "não existem favelas" nem drogas, e onde o meio ambiente é respeitado.

"Neste momento, os que melhor praticam a doutrina social da Igreja são os chineses", disse ele, acrescentando que, ao defender a dignidade da pessoa [!], a China, mais do que outros países, está seguindo a encíclica do papa Francisco, Laudato Si', defendendo o acordo climático de Paris.

"O pensamento liberal [leia-se protestante] liquidou com o conceito do bem comum, nem mesmo o leva em consideração, sustenta que é uma ideia vazia, sem nenhum interesse. Os chineses, ao contrário, não fazem assim; eles propõem o trabalho e o bem comum", disse Sorondo.

Segundo o chanceler, embora não existam relações formais entre a China e o Vaticano, há "muitos pontos em comum" entre os dois países.

Eu não tenho dúvidas quanto a isso. Além da doutrina social da Igreja (sobre a qual abordei aqui), vejamos outros pontos em comum que o bom monsenhor deixou de mencionar.

1. Aparato estatal de vigilância

China. Para regimes repressivos como o da China, controle social e político é indispensável. E quanto mais integrado no cotidiano das pessoas, melhor para o regime, que pode identificar, rastrear e segregar cidadãos que ele considera uma ameaça.

Nos últimos anos, Pequim tem endurecido o estado de segurança com a coleta indiscriminada de informações de seus cidadãos por meio de diferentes tecnologias de vigilância.

Uma vez centralizadas e cruzadas, essas informações criam perfis detalhados de cada cidadão e seu status no sistema de pontuação de crédito social chinês.

A ideia de uma vigilância no estilo de crédito social é que os cidadãos sejam recompensados pelo bom comportamento e penalizados pelo mau comportamento, sempre de acordo com os critérios da autoridade pública.

Roma papal. Em seu livro A Inquisição, Michael Baigent e Richard Leigh observam que o tribunal católico criou uma metodologia de intimidação e controle de tão impressionante eficiência que se pode ver nele um precursor da polícia secreta de Stalin, da SS e da Gestapo nazistas e, devo acrescentar, do sistema de repressão chinês.

Essa metodologia incluía a coleta sistemática e detalhada de informações obtidas de delatores, à qual interrogatórios posteriores acrescentavam mais informação, constituindo um imenso banco de dados onde todo esse material era eficientemente arquivado e catalogado para fácil recuperação.

Em 1316, por exemplo, mostrou–se que uma mulher fora presa pela primeira vez por heresia em 1268. De acordo com os autores, esse tipo de registro é um protótipo do tipo de registros computadorizados mantidos pelas forças policiais modernas com os quais o estado moderno controla seus cidadãos.

2. Liberdade religiosa vista como ameaça

China. Os regimes comunistas veem as crenças e práticas religiosas como uma ameaça inaceitável ao coletivismo e ao culto ao estado. Isso porque, para esses regimes, liberdade religiosa significa mais autonomia individual e, portanto, menos poder de controle e, consequentemente, menos autoridade.

Como forma de compelir lealdade ao estado e desencorajar a dissidência, os programas chineses de doutrinação das minorias religiosas se concentram no trabalho forçado, no isolamento dos prisioneiros, em elaboradas sessões de propaganda e na violência.

Documentos vazados do governo chinês em 2019 revelam o tratamento que Pequim dispensa às minorias religiosas. Eles detalham como centenas de milhares de muçulmanos e outras minorias são sistematicamente doutrinados e punidos em uma rede de campos de "reeducação" de alta segurança.

Documentos e imagens de milhares de uigures étnicos presos pelas autoridades chinesas, divulgados no final de maio deste ano, fornecem evidências adicionais indiscutíveis das enormes violações de direitos humanos do regime comunista na província de Xinjiang.

Roma papal. A Igreja Católica tem um longo histórico de perseguição às minorias religiosas. No primeiro volume de The Acts and Monuments of John Foxe, o autor apresenta nas páginas 517 e 518 uma breve lista dos principais escritores e pregadores que foram perseguidos e vitimados pela Igreja somente entre os séculos XIII e XIV.

Assim como os regimes comunistas, a Igreja Católica não pode sobreviver numa atmosfera de liberdade religiosa, pois Roma é um sistema rigidamente hierárquico governado a partir do topo de sua estrutura pelo chefe supremo da Igreja, o papa, o qual exige obediência incondicional.

Em sua encíclica Mirari Vos, Gregório XVI se referiu à liberdade de consciência como um "delírio", um "erro corrupto", "a maior e mais poderosa peste da república". E Pio IX, reafirmando na encíclica Quanta Cura as palavras de seu predecessor, considerou "em extremo perniciosa à Igreja Católica e à saúde das almas", além de "loucura", a "'liberdade de consciências e de cultos'".

Mais recentemente, o papa Francisco disse que a religião não deve estar "restrita" à consciência pessoal, em prejuízo do bem-estar da sociedade, mas deve ter seu papel reconhecido em conexão com as demandas de "uma sociedade civil pluralista", na qual igreja e estado compartilham a "responsabilidade comum" de atender às necessidades espirituais e físicas do povo.

3. Tortura como meio de inspirar obediência

China. Embora Pequim negue repetidamente, há evidências de que os campos de "reeducação" das minorias religiosas recorrem à tortura como meio de garantir obediência incondicional ao regime.

Oficiais e funcionários do Partido Comunista Chinês (PCC) desenvolveram uma variedade de métodos de tortura para coagir física e psicologicamente as minorias religiosas – sejam cristãos, uigures, praticantes do Falun Gong ou budistas – a renunciar à sua fé e saudar o Partido como o único objeto de sua lealdade e devoção.

Minghui.org, uma organização de voluntários com sede nos EUA dedicada a relatar a perseguição ao Falun Gong na China, documentou mais de 100 métodos de tortura usados rotineiramente para coagir esses praticantes, com muitos dos métodos também sendo empregados em outros crentes.

Como o ZeroHedge observou, o PCC e outros governos coletivistas veem as ideias como ameaças, porque ideias e crenças fora da doutrina estatal oferecem ESCOLHAS, e o poder da escolha é a solução definitiva para o leviatã do coletivismo. Visto que a escolha representa o fim dos regimes autoritários, ela deve ser eliminada.

Roma papal. Referindo-se às instruções transmitidas pelos veteranos do Santo Ofício aos inquisidores mais jovens quanto ao tratamento a ser dispensado aos hereges, Henry Charles Lea escreveu o seguinte em sua A History of the Inquisition of the Middle Ages, Volume 1:

Treinados através de longa experiência em um conhecimento preciso de tudo o que pode mover o âmago humano; hábeis não apenas para detectar as evasões sutis do intelecto, mas para buscar e encontrar o ponto mais delicado através do qual podem assaltar a consciência e o coração; implacáveis em infligir agonia ao corpo e à mente, seja pela miséria decadente e prolongada da masmorra sem esperança por incontáveis anos, seja pela dor mais intensa da câmara de tortura, ou jogando friamente com os afetos; recorrendo sem escrúpulos e violentamente às alternativas de esperança e medo; empregando com franqueza cínica todos os recursos de astúcia e fraude em miseráveis propositadamente famintos para torná-los incapazes de autodefesa, os conselhos que esses homens proferem podem muito bem parecer as sugestões de demônios exultantes no poder ilimitado de descarregar suas más paixões em mortais indefesos.

Mais adiante, o autor acrescenta:

O herege, reconhecido ou suspeito, não tinha direitos. Seu corpo estava à mercê da Igreja, e se pela tribulação da carne ele pudesse ser levado a ver o erro de seus caminhos, não havia hesitação em empregar quaisquer meios que estivessem à disposição para salvar sua alma e promover a fé.

Conclusão

Em setembro deste ano, em uma entrevista a repórteres a bordo do avião papal num voo de volta do Cazaquistão, o papa Francisco se recusou a classificar a China como antidemocrática. Ele também se recusou a apoiar o cardeal emérito de Hong Kong, Joseph Zen, preso em maio sob a lei de segurança nacional chinesa de 2020.

Em outubro, o Vaticano renovou seu acordo secreto com o PCC que permite a este último o direito de selecionar os bispos católicos do país. Apesar das muitas críticas, o Vaticano permanece inflexível, defendendo os proponentes do acordo e punindo os oponentes. O cardeal Zen é um deles.

É uma tolice pensar que Roma mudou. Roma não muda. E os protestantes também não deveriam mudar. Por amor às almas a perecer, devem expor o papado pelo que ele é, e não com base no ardiloso expediente da aparência de amabilidade.

Roma é um sistema apóstata que depôs a bandeira de Cristo e se afastou da "fé que uma vez por todas foi entregue aos santos." (Judas 3). Não se acha hoje em harmonia com o evangelho de Cristo mais do que em qualquer época passada de sua história.

As multidões que estão prontas para render-lhe homenagem hoje ignoram que as pretensões blasfemas do papado foram, em última instância, a causa das misérias que oprimiram a cristandade durante o longo período da hegemonia papal. Esqueceram-se de sua hostilidade às instituições livres, cerraram os olhos ao seu verdadeiro caráter.

Em breve veremos e sentiremos qual é o real propósito do papado. Quando a oportunidade chegar, e esta já se avizinha, Roma revelará na prática a que veio. Quem quer que creia na Palavra de Deus e a ela obedeça incorrerá, por esse motivo, em censura e perseguição.

Somente os que têm os pés bem firmados nos fundamentos da verdade presente, cujo coração tem sido renovado pelo Espírito Santo, poderão resistir e triunfar durante essa crise. Queira Deus que, para a glória de Cristo, estejamos entre eles.

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