Quanto mais Roma muda, mais permanece a mesma


Alguns líderes adventistas defendem avidamente a ideia de que, desde o Concílio Vaticano II, Roma mudou e tem sido uma grande defensora da liberdade religiosa.

Qualquer pessoa que queira verificar se isso procede ou não só precisa acessar os documentos do Concílio no site do Vaticano e examiná-los atentamente.

A rápida leitura que fizemos neste post da declaração Dignitatis Humanae – o documento que Ganoune Diop chamou de "um belo texto sobre liberdade religiosa" – foi suficiente para comprovar que Roma não mudou.

Mas se o leitor ainda tiver alguma dúvida, sugiro que leia a série de artigos de Matthew McCusker publicados no Life-Site News, um proeminente site católico conservador e pró-vida.

Há muita informação contida ali. Destacarei apenas as passagens mais relevantes (e perturbadoras).

A autoridade exclusiva e infalível da Igreja Católica

Na terceira parte de sua série sobre a natureza da verdadeira liberdade, McCusker escreveu:

A fim de nos ajudar a observar a lei moral, Deus a revelou diretamente à sua Igreja, que a ensina de forma autoritativa e infalível a cada geração. Portanto, há uma fonte externa da lei moral [a Igreja] que nos auxilia e fortalece a seguir a lei que encontramos em nossa própria natureza [a fonte interna].

Note que, de acordo com McCusker, a "lei moral" foi revelada "diretamente" à Igreja Católica e, portanto, ela é a única depositária e intérprete "infalível".

Mais do que isso, segundo a Prompta Bibliotheca de Lucius Ferraris, a Igreja, representada na pessoa de seu chefe, "pode modificar a lei divina, uma vez que seu poder não procede do homem, mas de Deus".

Não é necessário explicar, então, que a "lei moral" mencionada aqui é a lei modificada pela Igreja Católica, que excluiu o segundo mandamento, mudou o quarto (terceiro no Catecismo Romano) ao substituir o sábado pelo domingo e dividiu o último para conservar o número de dez preceitos.

É a lei assim modificada que a Igreja "ensina de forma autoritativa e infalível a cada geração", e não a lei moral como a encontramos em Êxodo 20:1-17.

Se aquela lei foi revelada "diretamente à Igreja" e é a única que pode ajudar "o homem a alcançar a liberdade moral", segue-se que ninguém pode desfrutar dessa "liberdade" fora da Igreja.

McCusker não tirou essas ideias da própria cachola. Ele se baseou nos ensinamentos da encíclica do papa Leão XIII, Libertas, Sobre a Natureza da Liberdade Humana.

Leis humanas como reflexo da "lei divina"

Na quarta parte de sua série, McCusker observa que "o objetivo da lei humana é o bem comum da sociedade que ela regula" e só pode ser justa se ela "deriva sua força normativa da lei natural e, portanto, da lei eterna de Deus".

Por isso,

Quando um homem obedece às leis justas do estado, ele está obedecendo principalmente a Deus, não ao homem. E quando o estado pune, ele o faz no exercício da autoridade que lhe foi dada por Deus.

Embora o conceito seja verdadeiro, há outra pegadinha aqui, além daquela que já mencionamos, ou seja, que a "lei eterna de Deus" é a lei modificada pela Igreja Católica a seu próprio critério.

McCusker cita Leão XIII:

Os preceitos, portanto, da lei natural, contidos corporalmente nas leis dos homens, não têm meramente a força da lei humana, mas possuem aquela sanção mais elevada e mais augusta que pertence à lei natural e à lei eterna.

Observe que, para atender ao bem comum da sociedade, as leis humanas devem derivar sua força normativa da lei natural e, sobretudo, da "lei eterna", da qual a Igreja de Roma é a única intérprete e fonte.

Você já deve ter notado qual é a conclusão lógica dessa linha de raciocínio.

Mais adiante, o papa diz:

A verdadeira liberdade da sociedade humana não consiste em cada homem fazer o que lhe agrada, pois isso simplesmente terminaria em tumulto e confusão e levaria à ruína do estado; mas sim no fato de que, por meio das injunções da lei civil, todos podem se conformar mais facilmente às prescrições da lei eterna [isto é, católica]. O dever do legislador civil é [note], principalmente, manter a comunidade em obediência por meio da adoção de uma disciplina comum e da restrição de homens refratários e com inclinação perversa, de modo que, dissuadidos do mal, eles se voltem para o bem ou, de qualquer forma, evitem causar problemas e perturbações ao estado.

Quem mais se enquadra na categoria de "homens refratários e com inclinação perversa", os quais devem ser "dissuadidos do mal" para que pratiquem o bem tal como definido pela Igreja ou, pelo menos, não sejam uma fonte de problemas e perturbações para o estado?

Descobriremos em instantes.

A força da tradição no âmbito legal

McCusker argumenta que uma lei só pode atender ao bem comum se for promulgada por uma autoridade legítima.

No entanto, se as leis forem contrárias ao "costume universal de um povo", a força dessas leis diminui "e, talvez, se torne totalmente nula".

Em outras palavras, o próprio costume de um povo pode ter força de lei, e qualquer lei humana que não o reconheça corre o risco de perder sua força normativa.

Mas McCusker não está falando do costume de qualquer povo. Ele explica citando Agostinho:

Os costumes do povo de Deus e as instituições de nossos antepassados devem ser considerados como leis. E aqueles que desprezam os costumes da Igreja devem ser punidos como aqueles que desobedecem à lei de Deus.

Então, o "costume universal de um povo" diz respeito, na verdade, aos "costumes da Igreja", os quais têm força de lei, e cuja desobediência deve ser punida pelas autoridades competentes como uma ofensa à própria lei de Deus!

Não, meu amigo! Isso não saiu das páginas mofadas de algum manuscrito perdido em um mosteiro da Idade Média. Foi publicado em julho de 2024 em um site católico!

McCusker conclui esta parte citando Leão XIII:

Portanto, a natureza da liberdade humana, qualquer que seja sua consideração, seja individualmente ou na sociedade, seja naqueles que comandam ou naqueles que obedecem, supõe [note] a necessidade de obediência a alguma lei suprema e eterna, que não é outra senão a autoridade de Deus [ou melhor, católica], que ordena o bem e proíbe o mal.

Roma reivindica ser a única depositária e intérprete da lei moral, que foi modificada por sua própria autoridade independentemente das Escrituras e transformada em tradição, a qual tem força de lei e deve ser reconhecida e preservada pelas autoridades civis.

Vejamos para onde essas ideias nos levam.

A doutrina da união entre igreja e estado

Na introdução da sexta parte – "A separação entre Igreja e Estado é um pecado: eis o motivo" – McCusker explica que, embora o título de seu artigo possa parecer chocante, ele "deriva do ensinamento do Papa Leão XIII", que escreveu (note as palavras):

É um crime público agir como se Deus não existisse. Da mesma forma, também é pecado o Estado não se importar com a religião como algo além de seu escopo, ou como algo que não traz nenhum benefício prático; ou adotar, dentre as muitas formas de religião, aquela que mais lhe agrada; pois somos [note, por favor] absolutamente obrigados a adorar a Deus da maneira que Ele demonstrou ser Sua vontade.

Amparando-se na encíclica papal, McCusker dá a entender que muitos dos problemas enfrentados pelo Ocidente moderno (aborto, redefinição do casamento, transgenerismo, violência etc.) se devem à negligência dessa doutrina – a união entre igreja e estado –, que Leão XIII enfatiza com estas palavras imperativas:

Todos os que governam devem, portanto, honrar o santo nome de Deus, e um de seus principais deveres [note] deve ser favorecer a religião [isto é, a católica], protegê-la, ampará-la sob o crédito e a sanção das leis [significando amplo reconhecimento público], e não organizar nem promulgar qualquer medida que possa comprometer sua segurança. Esse é o dever obrigatório dos governantes para com o povo sobre o qual governam.

McCusker resume assim essa doutrina:

A Igreja Católica ensina que, quando os católicos se unem para formar um estado, este também deve ter um caráter católico. E assim como é dever de todos os homens e mulheres crer em Deus e receber o evangelho, todos os estados também têm o dever de reconhecer publicamente Deus e a verdade da religião católica. O dever dos estados decorre logicamente do dever dos indivíduos.

Isso significa que "o estado não pode escolher uma religião para si mesmo, mas é obrigado a aderir à religião verdadeira".

Que religião é esta já está claro. McCusker, no entanto, a enfatiza citando o papa:

Ora, não é difícil descobrir qual é a verdadeira religião, se ao menos for buscada com uma mente sincera e imparcial; pois as provas são abundantes e impressivas. Temos, por exemplo, o cumprimento de profecias, milagres em grande número, a rápida disseminação da fé em meio a inimigos e diante de obstáculos esmagadores, o testemunho dos mártires e coisas do gênero. De tudo isso, torna-se evidente que a única religião verdadeira é aquela estabelecida pelo próprio Jesus Cristo e que Ele confiou à Sua Igreja para proteger e propagar.

Ele também cita o padre irlandês, Denis Fahey, para reforçar esse aspecto da doutrina católica:

O pensamento político e a ação política, portanto, em um Estado ordenado, respeitarão a jurisdição e a orientação da Igreja Católica, a Guardiã divinamente instituída da ordem moral, lembrando que o que é moralmente errado não pode ser politicamente bom...

Com base na doutrina papal, McCusker argumenta que, se igreja e estado tivessem permanecido unidos, a ordem da civilização cristã teria sido preservada, e os males que hoje afligem o mundo ocidental teriam sido evitados.

"Tragicamente, porém", diz McCusker, "a unidade da cristandade ocidental foi quebrada...". Por quem? "... primeiro pelo protestantismo e depois pela ascensão do liberalismo" (McCusker aborda ambos na quinta parte de sua série).

Ou seja, por terem transgredido a doutrina católica da "sagrada" união entre os poderes religioso e civil, a Igreja considera os protestantes os principais responsáveis pelas múltiplas crises que estão colapsando o Ocidente e, portanto, eles se encaixam naquela categoria de "homens refratários e com inclinação perversa" mencionada mais acima.

Como reverter essa "tragédia" provocada pelo protestantismo? Vejamos.

"Não há direito à prática pública de uma religião não católica"

Sim, é isso mesmo que você leu, caro leitor. Na nona parte de sua série, McCusker continua desenvolvendo seu raciocínio contra qualquer liberdade fora da Igreja Católica com base nas doutrinas papais. Ele escreve (note as palavras):

Atos públicos prejudiciais ao bem comum estão diretamente sujeitos ao poder restritivo do estado. Isso é aceito por todos, como algo natural, em inúmeras áreas da vida. Entretanto, a ideologia do liberalismo sustenta que alguns dos aspectos mais importantes da vida pública – o culto público a Deus e a propagação pública da doutrina religiosa – estão fora do alcance do estado. Pelo contrário, há poucas coisas mais gravemente imorais e mais gravemente prejudiciais ao bem comum do que a falsa adoração (não estamos considerando no momento as disposições subjetivas dos envolvidos) e a propagação de falsas doutrinas, que minam a verdadeira fé e privarão as almas da visão beatífica de Deus por toda a eternidade.

E acrescenta:

É esse dano incalculável ao bem comum que fundamenta o direito do estado de impedir a prática pública de religiões não católicas e a propagação de erros religiosos. Por esse motivo, o estado pode, e muitas vezes deve usar seu poder coercitivo para impedir coisas como: ritos não católicos de adoração pública, a construção de locais de adoração não católicos, a pregação pública de religiões falsas e a publicação de livros heréticos ou imorais.

McCusker cita Pio XII:

Aquilo que não corresponde objetivamente à verdade ou à norma da moralidade [da Igreja] não tem o direito de existir, de ser difundido ou de operar.

Se tudo isso não for uma demonstração clara de que Roma não mudou, não sei mais o que poderia ser. Mas McCusker não para aqui.

Como conclusão inevitável de sua linha de pensamento, ele diz que "o estado pode [e deve] coagir aqueles que abandonaram a fé católica", e cita o Catecismo do Concílio de Trento:

Os hereges e cismáticos são excluídos da Igreja, porque se separaram dela e pertencem a ela apenas como os desertores pertencem ao exército do qual desertaram. Não se deve negar, entretanto, que eles ainda estão sujeitos à jurisdição da Igreja, na medida em que [note] podem ser chamados perante seus tribunais, punidos e anatematizados.

"Tais pessoas", diz ele, mencionando Tomás de Aquino, "devem ser submetidas até mesmo à compulsão física, para que possam cumprir o que prometeram e manter o que receberam em algum momento"!

"Portanto", McCusker conclui,

aqueles que professaram a fé e a abandonaram estão em uma categoria diferente daqueles que nunca a conheceram. Os hereges, cismáticos e apóstatas podem ser obrigados a retornar à fé que traíram e podem ser punidos se não o fizerem. Essa é a base das leis contra a heresia que, em certas épocas, existiram e foram implementadas nos estados católicos. Em alguns períodos, isso resultou na aplicação da pena de morte àqueles que persistiram na heresia. Isso se deve à grave ameaça que a heresia pode representar para o bem comum, especialmente quando se trata de uma nova heresia [as doutrinas distintivas da Igreja Adventista?] que surge entre a população católica. Essa coerção não é uma violação da liberdade [!], porque a liberdade moral é o uso da liberdade natural de acordo com a razão.

As ênfases são minhas e não necessitam de comentários adicionais.

Para concluir

Devemos reconhecer que McCusker é zeloso, ousado e direto na defesa de sua fé, qualidades que faltam aos líderes adventistas com mentalidade ecumênica.

Sua admirável resolução em manter a ortodoxia de sua Igreja, apesar de falsa e perigosa, é uma dura repreensão a esses pastores fracos e condescendentes.

Embora seja possível que nem todos os católicos concordem com McCusker, há muitos que pensam como ele.

Seus comentários apenas refletem a doutrina milenar da Igreja Católica, que o Concílio Vaticano II claramente ratificou ao não revogar nenhuma das declarações papais anteriores.

Roma não muda nem jamais mudará. Para ela, a tolerância é somente uma concessão (transitória), não um direito que pode ser exigido.

O único direito que ela verdadeiramente reconhece e declara ser exclusivamente seu é o de dirigir as consciências e a ordem social sob a égide do poder civil.

O fato de ela ainda manifestar o mesmo orgulho e a mesma presunção arrogante que se assenhoreou de reis e príncipes e reivindicou as prerrogativas de Deus deve servir de advertência para nós, "sobre quem os fins dos séculos têm chegado".


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1 Comentários

  1. Este estudo é muito importante sobre Roma. Gosto muito deste assunto embora não tenha estudado. Sinto falta destes conhecimentos. Obrigada pelo envio

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