Cristo, nosso Juiz



O antigo santuário hebreu era muito mais do que um local de culto. Por meio de sua estrutura e serviços, os israelitas tinham acesso ao método divino de redenção que viria por meio de Jesus Cristo.

Todos os serviços típicos do santuário terrestre centralizavam-se em Jesus e revelavam de maneira extraordinariamente intensa as diferentes funções cumpridas pelo Salvador dentro do programa divino de redenção:

a) como o "Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo" (João 1:29), "sem defeito e sem mácula" (I Pedro 1:19), O qual se ofereceu "uma vez por todas" pelos nossos pecados (Hebreus 7:27; I Coríntios 15:3);

b) como nosso único Mediador junto ao Pai (I Timóteo 2:5), obtendo eterna redenção no "maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, quer dizer, não desta criação, e não por meio de sangue de bodes e de bezerros, mas pelo seu próprio sangue" (Hebreus 9:11-12);

c) como Juiz, que, na presença do Pai, preside o tribunal celestial para fazer "justiça aos santos do Altíssimo", a fim de que possam possuir o reino que lhes está preparado desde a fundação do mundo (Daniel 7:9-10, 13-14 e 22; Mateus 25:34).

Sobre essa última dimensão do ministério redentor de Jesus, as Escrituras também declaram:

E o Pai a ninguém julga, mas ao Filho confiou todo julgamento. (João 5:22)
E lhe deu autoridade para julgar, porque é o Filho do Homem. (João 5:27)
E nos mandou pregar ao povo e testificar que ele é quem foi constituído por Deus Juiz de vivos e de mortos. (Atos 10:42)

Cristo é o juiz único porque está especialmente capacitado para esta função, visto ser Ele o Criador e Redentor do mundo (Hebreus 1:1-3). Ao assumir o lugar do homem, suportou todas as tentações e prevaleceu, sem pecado (Isaías 53:7 e 9; João 8:46; Hebreus 2:17-18; 4:15; I Pedro 1:19). Ellen G. White declara:

Cristo aceitou a natureza humana e viveu na Terra uma vida pura e santificada. Por esta razão Ele recebeu a designação de Juiz. Aquele que ocupa a posição de Juiz é Deus manifestado na carne. (1)

Deus tem, portanto, um dia em que, por meio de Jesus Cristo, julgará os segredos dos homens segundo o evangelho (Romanos 2:16). Esta obra de julgamento não ocorre "num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, mas no próprio céu", em que Cristo "comparece por nós perante a face de Deus". Ele não tem a necessidade de "se oferecer muitas vezes, como o sumo sacerdote de ano em ano entra no lugar santo com sangue alheio", porque "uma vez por todas se manifestou, para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo" (Hebreus 9:24-26).

É com base nesse ato de redenção único e todo-abrangente que Cristo exerce Seu ministério no santuário celestial como nosso Intercessor e Juiz, cumprindo o Dia da Expiação típico - um ministério que tem lugar antes do segundo advento de Cristo e que abrange todos os que professam o Seu nome (Romanos 14:10; II Coríntios 5:10).

Um juízo a favor dos santos


Mas por que razão os santos serão julgados afinal? Cristo mesmo não disse em João 5:24, "Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna, não entrou em juízo, mas passou da morte para a vida"? A resposta está na natureza e no objetivo final do juízo pré-advento.

Consideremos, antes de tudo, a cena descrita em Daniel 7:9 e 10, 13 e 14, e que cumpre com notável magnificência o Dia da Expiação típico:

Continuei olhando, até que foram postos uns tronos, e o Ancião de Dias se assentou; sua veste era branca como a neve, os cabelos da cabeça, como a pura lã; o seu trono eram chamas de fogo, e suas rodas eram fogo ardente. Um rio de fogo manava e saia de diante dele; milhares de milhares o serviam, e miríades de miríades estavam diante dele; assentou-se o tribunal, e se abriram os livros... Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha com as nuvens do céu um como o Filho do Homem, e dirigiu-se ao Ancião de Dias, e o fizeram chegar até ele. Foi-lhe dado domínio, e glória, e o reino, para que os povos, nações e homens de todas as línguas o servissem; o seu domínio é domínio eterno, que não passará, e o seu reino jamais será destruído.

Daniel claramente se refere a um tribunal divino em sessão, no qual o Pai e o Filho se unem na ação de julgar. Note que a visão não retrata Deus exercendo juízo sobre a Terra, mas no Céu, com grande pompa e circunstância, perante uma infinidade de testemunhas celestiais. Trata-se do juízo pré-advento ou investigativo - a derradeira fase do ministério de Cristo como nosso Sumo Sacerdote no santuário celestial em favor de Seu povo e contra os inimigos de Deus (Daniel 7:21-22, 24-27).

Jesus Cristo é o Filho do Homem - título messiânico usado pela primeira vez em Daniel e que o Salvador aplicou a Si mesmo durante Seu ministério terrestre para destacar Sua eterna ligação com a humanidade (Marcos 2:10; 10:45; Lucas 5:24; I Timóteo 2:5; Hebreus 2:17-18; 4:15).

Daniel nota que Cristo não vem com as nuvens em direção a Terra, mas ao Ancião de Dias, de quem recebe altas honras: domínio, glória e autoridade para governar e julgar. Essa relação precisa ser entendida à luz da história da redenção, antes que possamos compreender o significado de João 5:24.

Cristo sempre possuiu autoridade e domínio, porque é Deus (João 1:1 e 18; Romanos 9:5; Colossenses 1:15-18; 2:9; Tito 2:13; Hebreus 1:8 e 10; II Pedro 1:1; I João 5:20). Deixando as cortes celestiais, Cristo se fez um de nós para condenar o pecado e redimir o pecador (João 3:16; Romanos 8:1-4; II Coríntios 5:21; I Timóteo 1:15; Hebreus 10:5). Não foi constrangido a isso, mas o fez voluntariamente (João 10:14-18).

Vencendo o pecado na cruz, e a morte, na ressurreição, Cristo subiu ao Céu, recebendo toda a honra e glória que Lhe são devidas e assentando-se à direita do Pai (João 16:33; I Coríntios 15:20; Atos 1:9-11; Hebreus 1:1-4). Jesus é, agora, o nosso Sumo Sacerdote (Hebreus 4:14-16; 8:1-2) que intercede por nós diante do Ancião de Dias, no santuário celestial (Hebreus 7:25; 8:1-2; Apocalipse 3:5). Em breve, Ele substituirá as vestes sacerdotais por vestes reais, quando então os inimigos de Deus e de Seu povo serão feitos estrado dos Seus pés (Hebreus 10:13; Salmo 110:1).

Referindo-se a esta fase final da obra divina no santuário celestial, Ellen White diz:

Assistido por anjos celestiais, nosso grande Sumo Sacerdote entra no lugar santíssimo, e ali comparece à presença de Deus a fim de Se entregar aos últimos atos de Seu ministério em prol do homem, a saber: realizar a obra do juízo de investigação e fazer expiação por todos os que se verificarem com direito aos benefícios da mesma. (2)

Assim como o Dia da Expiação favorecia os israelitas fiéis que permaneciam em solene exame de coração, em sincera confissão e arrependimento, o juízo pré-advento realizado por Cristo em Seu santuário favorece os santos do Altíssimo que examinam cuidadosamente a própria vida e comparam seu caráter à norma de justiça. A estes será permitida a posse do reino eterno de Deus pela fé em Jesus (Daniel 7:22, 26 e 27; Apocalipse 22:14).

Pois bem, voltando a João 5:24, é significativo que o substantivo grego krisis seja usado nesse texto, pois expressa, na maior parte dos casos, julgamento penal, no sentido de "condenação" e o "castigo" decorrente.

Em II Pedro 2:4 e 11, krisis é empregado como um juízo que leva à condenação pelo Juiz divino (verso 9). O crente que permanece fiel "não entra em juízo" [krisis], isto é, "não entra em condenação" (New American Bible), "não será condenado" (Nova Versão Internacional). A Modern Language Bible diz: "não está sujeito à sentença", ou seja, "sentença" condenatória. (3)

Portanto, o que Cristo promete aos Seus servos fiéis em João 5:24 não é isenção do julgamento, mas absolvição!

"Todos havemos de comparecer ante o tribunal de Deus" (Romanos 14:10). Contudo, nenhum de nós poderá alcançar uma sentença favorável com base nos próprios méritos.

Não podemos nos defender das acusações de Satanás (Zacarias 3:1; Apocalipse 12:10) nem tampouco apelar diretamente a Deus em nosso favor, pois nossa justiça é como "trapo de imundícia" (Isaías 64:6) e "não há justo, nem sequer um" (Romanos 3:10-12), e ainda: "Quem pode dizer: Purifiquei o meu coração, limpo estou do meu pecado?" (Provérbios 20:9). Certamente, ninguém pode. "Pelo que ainda que te laves com salitre e amontoes potassa, continua a mácula da tua iniquidade perante mim, diz o Senhor Deus." (Jeremias 2:22).

Por conseguinte, necessitamos de Cristo como nosso único Redentor, Advogado e Juiz junto ao Pai (Atos 4:12; I João 2:1; Apocalipse 3:5).

Ele diz: "Eu, eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões por amor de mim e dos teus pecados não me lembro" (Isaías 43:25), e a todos estende o convite: "Vinde, pois, e arrazoemos, diz o Senhor; ainda que os vossos pecados sejam como escarlata, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a lã" (Isaías 1:8). E, em outra parte, declara: "Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça" (I João 1:9).

Valendo-se dos méritos do Salvador com base na promessa, o salmista clamou em sua angústia: "Compadece-te de mim, ó Deus, segundo a tua benignidade; e, segundo a multidão das tuas misericórdias, apaga as minhas transgressões. Lava-me completamente da minha iniquidade e purifica-me do meu pecado." (Salmo 51:1-2).

Os que verdadeiramente aceitam a graça de Cristo mediante a fé recebem perdão, justificação e redenção. Essa aceitação implica reconhecimento de nossa verdadeira condição perante Deus, confissão e arrependimento dos pecados, e um novo nascimento no poder do Espírito Santo.

O pecador alcança misericórdia (Salmo 32:5; Provérbios 28:13) e é chamado bem-aventurado por lavar "suas vestiduras no sangue do Cordeiro" (Apocalipse 22:14). A condenação que pesava sobre ele é removida pelos méritos de Jesus, e é declarado participante de Sua perfeita justiça.

O Senhor resgata a alma dos seus servos, e dos que nele confiam nenhum será condenado. (Salmo 34:22)
Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus... Quem os condenará? É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós. (Romanos 8:1 e 34)

A natureza do juízo divino


Ao descrever a derradeira fase da obra divina de redenção realizada pelo Filho do Homem no santuário celestial, Daniel contrasta a natureza brutal e efêmera dos poderes terrestres com o justo e eterno governo de Deus.

Os impérios mundiais, simbolizados por animais selvagens, foram forjados pela força e opressão (Daniel 7:1-8 e 17). O "chifre pequeno", pretensiosamente competindo pelo ministério redentor de Cristo realizado no santuário celestial, tem decidido quem está ou não apto à salvação mediante ações arbitrárias (Daniel 7:8, 21 e 25).

Nosso Salvador, por outro lado, não estabelece Seu domínio pela força, mas por meio de um julgamento justo, mostrando que a destruição final do pecado e dos pecadores rebeldes tem um fundamento legal. Seu domínio é assegurado pelo reconhecimento universal da legitimidade do governo de Deus, que condena Satanás e seus representantes.

O juízo tem início após a obra do poder religioso apóstata simbolizado pelo chifre pequeno, que se levanta contra Deus e persegue Seu povo a ponto de quase exterminá-lo (Daniel 7:7-11, 21, 22, 25-27). O julgamento celestial assegura que o mal não dominará indefinidamente sobre os santos e o mundo, porque o domínio ser-lhe-á tirado e conferido a Cristo e Seus remidos (Apocalipse 11:15; 19:6-7).

A abertura dos livros (Daniel 7:10) indica que nosso Sumo Sacerdote não passará nada por alto. Pela morte do Filho de Deus na cruz, o pecado foi decisivamente julgado. O mesmo acontece no juízo. Nenhum governo divino seria possível se Deus tolerasse o pecado. O abrir dos livros, porém, não beneficiará a Cristo, que sabe todas as coisas, mas o Universo, diante do qual serão reafirmadas a justiça e a legitimidade do trono de Deus. As dúvidas instigadas por Satanás demonstrar-se-ão, então, absolutamente infundadas.

O fundamento de nossa fé e esperança está na obra completa de Cristo como nosso Sacrifício, Mediador e Juiz.

Podemos estar certos de que teremos um juízo a nosso favor, desde que permaneçamos nEle, e Ele, em nós, de modo a sermos continuamente aperfeiçoados no Seu amor (João 8:31; 15:4-5; Gálatas 5:1; Filipenses 4:1; I João 2:5-6 e 28; 3:24; 4:16-18; 5:20). Apenas por meio de Sua graça e justiça é possível viver em harmonia com os santos requisitos de Deus (Romanos 2:13; 6:1-4; Tito 2:11-12; Apocalipse 3:5).

O juízo pré-advento também é apresentado por Cristo na parábola das bodas (Mateus 22:1-14). O conceito de investigação antes da execução da sentença evidencia-se quando o próprio Rei faz um exame prévio dos convidados para ver se são dignos de participar das bodas. O resultado dessa investigação determina quem pode permanecer e quem não pode.

A veste nupcial simboliza a justiça de Cristo, Seu caráter imaculado, que, pela fé, é atribuída e comunicada aos que O aceitam como seu Salvador (Romanos 5:1; Apocalipse 19:7-8).

Somente o Rei pode providenciar semelhante vestidura, de modo que os convidados sejam dignos de entrar na cidade de Deus pelas portas (Apocalipse 22:14). Nenhuma veste tecida, comprada ou emprestada por homem algum pode garantir um juízo a seu favor. O Rei julga e pune o homem sem as vestes especiais que Ele proveu porque ninguém pode participar das bodas do Cordeiro com base na justiça própria.

Aos que, porém, corresponderem ao solene convite de nosso Salvador (Apocalipse 14:7) e consentirem, mediante a fé, em "vestir-se de linho finíssimo, resplandecente e puro" - vestimenta que os verdadeiros seguidores de Cristo possuirão - certamente exultarão como o profeta Isaías:

Regozijar-me-ei muito no Senhor, a minha alma se alegra no meu Deus; porque me cobriu de vestes de salvação e me envolveu com o manto da justiça, como noivo que se adorna de turbante, como noiva que se enfeita com as suas joias. (Isaías 61:10)

Notas e referências


1. Ellen G. White. Exaltai-O. Meditação Matinal 1992. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, p. 349.

2. _____________. O Grande Conflito. 19ª edição. Santo André, SP: CPB, 1978, p. 480.

3. Gerhard F. Hasel. "Julgamento Divino". Em Tratado de Teologia Adventista do Sétimo Dia. Raoul Dederen (Ed.). Tatuí, SP: CPB, 2011, p. 907.

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