Na década de 1950, os católicos americanos não eram mais uma comunidade minoritária à margem da sociedade americana. Eles agora representavam um quarto da população e ocupavam cargos profissionais e gerenciais em todo o país. Não estavam mais presos à "antiga vizinhança" por sua situação econômica. E, à medida que subiam na escala social, os descendentes dos imigrantes católicos que dirigiam os nickelodeons e os cinemas também se tornavam diretores.
Além disso, durante esse período (os anos imediatamente posteriores à guerra), o romanismo americano não apenas floresceu, mas tornou-se menos "europeu". Os próprios romanistas americanos, tendo apoiado o nacionalismo anticomunista, passaram a ser amplamente aceitos, tanto nos Estados Unidos tradicionais, com sua classe média católica recém-rica, quanto na política americana. Na América do final dos anos 1950 e início dos anos 1960, era possível ver os católicos dominando a cultura popular, com destaque para Frank Sinatra no setor musical. Na TV, o monsenhor papista Fulton J. Sheen tinha um programa intitulado Life Is Worth Living. "Depois de um século ou mais nos guetos urbanos, de repente os católicos estavam em toda parte." [344]
Não havia nada de casual nisso. A "Igreja" de Roma trabalha incansavelmente para controlar o mundo e sabia muito bem que, se pudesse conquistar os Estados Unidos da América, ela conquistaria o mundo ocidental. O controle dos meios de comunicação de massa, especialmente cinema e TV, garantiria a manipulação e a doutrinação do público em geral, devotado como era a suas fontes visuais de entretenimento e notícias.
No entanto, o domínio católico da sociedade americana seria constantemente desafiado na Hollywood dos anos 1950.
Bitter Rice (1950): o enfraquecimento continua
A erosão da autoridade da PCA e da Legião foi vista novamente em outro filme produzido na Itália, Bitter Rice, dirigido por Giuseppe De Santis e lançado em 1950. Contém cenas provocantes, danças sedutoras, nado nu, sexo ilícito e um enredo que incluía aborto, um assassinato horrível, suicídio, etc. Os distribuidores, Lux Films, nem sequer solicitaram um selo da PCA, e o filme já estava sendo exibido nos Estados Unidos há algum tempo antes de Breen e sua equipe o verem. Eles ficaram chocados com a imoralidade e a nudez. Quigley e a Legião o condenaram, e a Legião o classificou como ofensivo aos "princípios cristãos e tradicionais de moralidade". O The Tidings, um jornal romanista de Los Angeles, disse que era um filme de inspiração comunista.
Outros importantes papistas também estavam preocupados com o filme, mas a PCA não podia negar-lhe um selo porque a Lux Films não havia solicitado um! Eles não puderam impedir que o filme fosse exibido e, de fato, um grande número de pessoas foi assisti-lo.
Como esse filme em particular recebeu uma distribuição mais ampla do que o normal para produções estrangeiras, o padre Little, preocupado que uma campanha nacional o tornasse ainda mais popular, aconselhou os diretores locais da Legião a agirem da maneira que achassem melhor em suas áreas específicas. Assim, as respostas variaram, embora a maioria das dioceses tenha decidido simplesmente ignorar o filme, esperando que, com isso, fracassasse naturalmente. Mas isso não aconteceu, e o jogo continuou.
Contudo, a Lux Films percebeu que poderia lucrar ainda mais se a produção estivesse em conformidade com os padrões da Legião, de modo que o órgão removesse a classificação "C". Após grandes cortes, o filme foi finalmente reclassificado como "B".
The Miracle (1950): a batalha contra a censura "sacrílega"
Era evidente que, embora seu poder ainda fosse considerável, a PCA e a Legião não desfrutavam mais do status de outrora. O mundo já não era o mesmo, e havia uma enorme batalha em andamento pelo controle do cinema. O lançamento nos Estados Unidos de outro filme estrangeiro, The Miracle, era uma confirmação clara disso.
Em 1950, Roberto Rossellini, um ex-diretor italiano católico, produziu Il miracolo (em inglês, The Miracle), que foi exibido em um cinema de arte na cidade de Nova York. Não apresenta cenas de nudez nem crime, mas é "uma parábola religiosa moderna" e a "Igreja" de Roma ficou furiosa com a produção. [345] O filme conta a história de uma mulher simples, pastora de cabras, que acredita ter conhecido "São" José. Quando fica misteriosamente grávida, ela acredita que José é o pai e, por isso, é condenada ao ostracismo e ridicularizada, finalmente dando à luz em um prédio da "igreja" local. Quando o filme estreou na Itália, uma organização similar à Legião da Decência o condenou veementemente como uma "profanação abominável", mas o Vaticano se absteve de suprimi-lo. Os principais papistas não tinham certeza de como interpretar a produção. Poderia ser um ataque à doutrina da concepção e do nascimento virginal, mas também poderia ser simplesmente um comentário sobre a intolerância da sociedade moderna. Em todo caso, o filme não foi muito bem nas bilheterias italianas.
Nos EUA, entretanto, a situação era bem diferente. Joseph Burstyn, que estava encarregado de exibi-lo na cidade de Nova York, não era legalmente obrigado a buscar um selo de aprovação da PCA, já que o filme foi exibido no circuito de arte. Mas a Legião condenou a produção como sacrílega e blasfema, e o comissário de licenças do conselho de censura do Estado de Nova York, Edward McCaffrey, um católico, proibiu sua exibição, apesar de tê-la aprovado a princípio. O filme foi retirado de cartaz, mas os distribuidores contestaram judicialmente, e uma audiência formal foi marcada para janeiro de 1951. Essa publicidade fez maravilhas pelo filme, que se tornou extremamente popular. Os católicos fizeram piquetes nos cinemas que o exibiam, mas a ACLU e vários jornais intervieram, defendendo o filme e o direito das pessoas de assisti-lo. E, de fato, a maioria o assistiu. O tribunal decidiu que McCaffrey havia extrapolado sua autoridade ao proibir sua exibição.
O cardeal de Nova York, Francis Spellman, ficou indignado e, em uma carta lida em todas as missas da arquidiocese de Nova York, ele deixou claro seus sentimentos, chamando o filme de "uma afronta desprezível a todo cristão" e "um insulto cruel à mulher italiana", conclamando os papistas a boicotarem o filme e deixando claro que acreditava que era de inspiração comunista com o objetivo de ridicularizar a religião "cristã" (ou seja, a religião católica) e promover a sujeição dos Estados Unidos ao comunismo ateu. Ele pediu a todas as pessoas decentes que se unissem a ele para se opor aos "lacaios de Moscou" em suas tentativas de "escravizar esta terra de liberdade". Esse hipócrita religioso falou da América em termos radiantes, mas estava bem ciente de que sua própria "Igreja" odiava as liberdades desfrutadas pelos americanos e sempre lutou contra elas! Os católicos americanos atenderam ao apelo de Spellman, e as filas de piquetes compostas por veteranos de guerra católicos diante do cinema que exibia o filme se expandiram para mais de mil pessoas. Os cartazes dos manifestantes diziam: "Esse filme é um insulto a toda mulher decente e à sua mãe"; "Não seja comunista - todos os comunistas estão lá dentro" e "Não entre nessa fossa". Os manifestantes insultaram aqueles que tentaram comprar ingressos. Contra-piquetes também se formaram do lado de fora do cinema, enquanto os ministros protestantes reclamavam que os papistas estavam impondo sua vontade a todos os outros. As atitudes se endureceram em ambos os lados. Foram feitas ameaças de bomba contra o cinema e contra a Catedral Católica de São Patrício!
No entanto, apesar de todos os esforços de Roma, as multidões continuavam indo ao cinema.
Em seguida, Martin Quigley interveio com um editorial que, assim como Spellman, classificou o filme como comunista: "Com os americanos morrendo diariamente na Coreia e a nação se preparando para uma guerra total, se necessário, para preservar nosso modo de vida, que se baseia na crença em Deus e nos direitos inalienáveis do homem, é intolerável que um filme como The Miracle seja exibido em um cinema americano. Seu local lógico de nascimento no mundo moderno é a União Soviética." [346]
Foi totalmente hipócrita da parte desse católico falar em defesa do estilo de vida americano, quando Roma estava trabalhando para destruí-lo e transformar os Estados Unidos em uma nação papista. Mas, naturalmente, esse foi o período anterior ao papa pró-comunista, João XXIII, e o papado ainda era anticomunista. Isso mudaria em apenas alguns anos. Foi irônico, também, que Quigley tenha falado da crença dos Estados Unidos nos "direitos do homem", um conceito nascido do próprio sistema humanista/comunista que ele estava condenando e ao qual, naquela época, Roma se opunha fortemente.
Mas a maior de todas as ironias foi esta: "Quigley pode ou não ter sabido que a União Soviética rejeitou o filme porque, em sua opinião, era 'propaganda pró-católica'". [347] Sem dúvida, havia filmes pró-comunistas e anticatólicos chegando aos Estados Unidos, e eles definitivamente tinham como objetivo minar o país; mas, aparentemente, The Miracle não era um deles. Rotulá-lo, porém, como tal foi uma maneira simples de a hierarquia católica despertar a ira dos romanistas americanos anticomunistas. Foi uma maneira perfeita de matar dois coelhos com uma cajadada só: exercer o poder de Roma sobre o que podia ou não ser exibido nas telas americanas e, ao mesmo tempo, desferir um duro golpe contra o comunismo, que ainda era o inimigo amargo de Roma naquela época.
Assim, "os católicos, do cardeal Spellman até os leigos, acusavam livremente todos os que eram a favor da exibição do filme de serem comunistas; piquetes e ameaças de bomba foram usados na tentativa de impedir que o público o visse; os corajosos o suficiente para enfrentar o desafio foram acusados de serem comunistas ou simpatizantes comunistas; representantes protestantes e católicos discutiram sobre o que era ou não sacrilégio; e os críticos de cinema profissionais premiaram The Miracle, na melhor das hipóteses um filme levemente curioso, como o Melhor Filme Estrangeiro do ano". [348]
O conselho de censura do Estado de Nova York se viu agora sob enorme pressão para revogar sua decisão anterior de permitir a exibição do filme. Burstyn e seus advogados argumentaram que a aversão ao filme era praticamente limitada aos católicos e apresentaram como prova centenas de cartas de ministros protestantes que não viam nada de errado com a produção. Isso não significava que fosse verdade, visto que nessa época (meados do século XX) muitas denominações e igrejas protestantes já eram liberais tanto na doutrina quanto na prática. Mas Burstyn estava correta ao afirmar que foram principalmente os católicos que ficaram indignados com o filme.
No entanto, sob extrema pressão da máquina papal nos Estados Unidos, o conselho de censura de Nova York revogou a licença para a exibição do filme, declarando como motivo que a lei de Nova York insistia que "homens e mulheres de todas as crenças respeitassem as crenças religiosas de outras pessoas" e que o filme associava as versões católica e protestante da Bíblia com "embriaguez, sedução e lascívia" e, portanto, era sacrílego.
Mas as coisas estavam mudando nos círculos católicos. Algumas publicações romanistas criticavam sua própria "Igreja" por seus piquetes e seu estilo ditatorial. Um editorial do Commonweal dizia: "Estamos sobrecarregados com um antigo complexo de cerco". O artigo prossegue afirmando que o uso de ameaças pela "Igreja" romana, em vez de persuasão, pode ter feito com que aqueles que não eram católicos "se sentissem como se estivessem sendo tratados como crianças por uma força estrangeira que não dava dois centavos por sua liberdade pessoal". Essa foi uma crítica forte de uma publicação papista. Houve católicos que criticaram sua "Igreja" pela forma como lidou com o problema e perderam seus empregos. Um deles foi Frank Getlein, crítico de cinema do Catholic Messenger de Davenport, Iowa, demitido da Fairfield University, uma faculdade católica em Connecticut. Outro foi William Clancy, professor de inglês na Universidade de Notre Dame, cujo artigo, "The Catholic as Philistine", no qual chamou a campanha católica contra o filme de "Macarthismo semi-eclesiástico", também lhe custou o emprego. [349]
Burstyn foi derrotado, mas não desistiu e recorreu da decisão. Mas quando o Tribunal de Apelações do Estado de Nova York a manteve, ele entrou com uma petição na Suprema Corte dos Estados Unidos em dezembro de 1951. Os argumentos orais do caso Burstyn v. Wilson foram marcados para abril de 1952. Burstyn estava contestando a decisão da Suprema Corte de 1915 em Mutual v. Ohio (examinada anteriormente neste livro), que havia confirmado a constitucionalidade dos conselhos de censura estaduais.
Ephraim London, que representou Burstyn, argumentou que o filme tinha direito à liberdade que a Constituição dos EUA garante à imprensa, pois comunicava ideias da mesma forma que esta. Citando centenas de cartas e petições de ministros protestantes e de pessoas que afirmaram que não viam The Miracle como sacrílego, London argumentou que o estado extrapolou a Constituição ao defender as opiniões religiosas de um grupo (nesse caso, as opiniões da "Igreja" de Roma) acima de todos os outros.
London estava certo: na América, nenhum ponto de vista religioso poderia ser defendido acima de qualquer outro; uma lei muito sensata e sábia. Foi o que impediu que os Estados Unidos perseguissem pessoas por causa de sua religião, como aconteceu com frequência em muitos outros países do mundo onde essa lei não existia. Não cabe ao governo interferir em assuntos religiosos. Onde quer que os governos tenham feito isso, a perseguição se seguiu inevitavelmente. O dever do estado limita-se a questões materiais, não espirituais. Se os cidadãos forem ameaçados ou prejudicados fisicamente, então o estado deve intervir. Mas em questões religiosas, ele não tem jurisdição de Deus e, na prática, convém que não tenha nenhuma.
O resultado foi que, em 26 de maio de 1952, a Suprema Corte reverteu a decisão do Tribunal de Apelações de Nova York. Ao redigir a decisão unânime do tribunal, o juiz Tom Clark declarou exatamente o que acabou de ser exposto como a abordagem adequada, se ao menos os governos a seguissem. Segundo ele, o estado não tem "nenhum interesse legítimo em proteger qualquer religião ou todas as religiões de opiniões desfavoráveis" e que não é função do governo "suprimir ataques reais ou imaginários a uma doutrina religiosa específica, quer apareçam em publicações, discursos ou filmes". [350]
Essa posição sábia e sensata poderia ser justificadamente apelidada de princípio de Gálio: quando "os judeus, unânimes, se insurgiram contra Paulo e o levaram ao tribunal, dizendo: Este persuade os homens a adorarem a Deus contra a lei", Gálio, o deputado da Acaia, respondeu: "Se se tratasse de injustiça ou de perversidade, ó judeus, eu vos suportaria: Se, porém, se trata de palavras, de nomes, e da vossa lei [religiosa], vede-o bem, porque eu não quero ser juiz de tais questões" (Atos 18:12-15). Naturalmente, suas palavras não condiziam com seus atos, pois quando os gregos espancaram o chefe da sinagoga, somos informados de que "Gálio não se importava com nada disso" (v.17), embora fosse definitivamente "uma questão errada"; mas ele estava certo em sua posição de que não lhe cabia, como líder político, envolver-se em questões religiosas. Se ao menos os governos tivessem tido o mesmo sentimento ao longo dos séculos, teria havido muito menos perseguição religiosa no mundo! A função do governo é manter a lei e a ordem, punir os malfeitores, etc. Não é sua função regular a religião nem o discurso religioso ou intrometer-se em questões espirituais de qualquer tipo. Os Estados Unidos, mais do que qualquer outra nação na história do mundo, procuraram separar a autoridade estatal da autoridade religiosa, recusando-se a se envolver em controvérsias religiosas. Isso evitou a perseguição por motivos religiosos, pois é um fato histórico que, sempre que um governo se envolve em tais assuntos, a perseguição é inevitável.
Quem dera se o mundo inteiro adotasse o princípio de Gálio! Tragicamente, hoje, até mesmo os Estados Unidos estão se afastando rapidamente desse princípio, interferindo cada vez mais em assuntos religiosos e hostilizando aqueles que se opõem, por razões espirituais, a religiões como o catolicismo e o islamismo.
E aqui uma palavra deve ser dita também aos cristãos que acreditam que o governo deve se envolver na defesa da verdadeira fé cristã. Isso é tão errado quando se trata da verdadeira fé como quando se trata de religiões falsas! Alguns cristãos que se dizem evangélicos acreditam que, se a maioria da população professa ser cristã, o governo deveria proibir todas as publicações, filmes, etc. hostis à fé cristã. Nesse ponto, eles estão redondamente enganados. Os seguidores de Cristo devem proclamar o Evangelho de Cristo pelo método da pregação, da persuasão (2 Cor. 5:11), e ele será recebido por todos os que foram ordenados para a vida eterna (Atos 13:48). [a] Não precisamos, nem devemos jamais buscar legislar o cristianismo.
Assim como a decisão da Suprema Corte de 1915 foi um momento decisivo na história do cinema, quando (como visto anteriormente) os filmes foram declarados como um "negócio, puro e simples", que poderia ser regulamentado, a decisão de 1952 representou outro momento decisivo. A decisão de 1915 foi agora revertida, com o tribunal argumentando que os filmes eram veículos transmissores de ideias e, como tais, estão amparados pela cláusula de liberdade de expressão da Constituição dos EUA e, portanto, não podem sofrer censura.
Contudo, declarou que não havia decidido "se um estado pode censurar filmes de acordo com uma lei claramente elaborada e aplicada para impedir a exibição de produções obscenas. Essa é uma questão muito diferente da que temos agora em mãos. Sustentamos apenas que, de acordo com a Primeira e a Décima Quarta Emendas, um estado não pode proibir um filme com base na conclusão de um censor de que ele é 'sacrílego'". Assim, segundo a Suprema Corte, poderia ter sido legal uma lei de censura contra filmes obscenos.
A decisão da Suprema Corte foi um grande golpe para os conselhos de censura em toda a América e, nos anos seguintes, eles deixariam de funcionar, visto que a maioria deles continha declarações que proibiam filmes por motivos sacrílegos, o que agora era inconstitucional. Ademais, essa decisão restringiu severamente o poder de Joseph Breen e da PCA de exigir que o material que violasse o Código de Produção fosse removido dos filmes. A censura ainda estava em vigor após essa decisão, mas achava-se agora bastante enfraquecida legalmente.
A Legião da Decência foi a mais afetada. Apesar de afirmar que só avaliava filmes para o público católico, e não os censurava, a Legião fez o possível para impedir que todos os americanos vissem The Miracle, independentemente de suas crenças religiosas. E fez isso de uma maneira particularmente cruel, com boicotes, piquetes, ameaças de atentados a bomba, etc. "Em essência, a Igreja Católica, por meio da Legião, exigiu que o estado declarasse a teologia católica como dogma oficial. As organizações protestantes se opuseram, com razão, a dar esse tipo de sanção à Igreja, assim como a Suprema Corte dos EUA. Os limites da separação entre igreja e estado permaneceram firmemente definidos." [351] Foi um grande revés para as tentativas de Roma de aumentar seu poder sobre a vida do povo americano. Se tivesse sido bem-sucedida, a "Igreja" de Roma teria expandido enormemente sua influência sobre esse país que há tanto tempo tentava conquistar. Teria sido um passo gigantesco para se tornar a "Igreja Estatal" oficial dos EUA, algo totalmente alheio à Constituição e a tudo o que os Estados Unidos representam desde sua fundação. Mas o Senhor soberano havia decretado o oposto e, providencialmente, essa ousada trama foi derrubada naquele momento. No entanto, Roma não desistiria.
Como resultado de suas ações contra The Miracle, a Legião da Decência sofreu um duro golpe. Até mesmo muitos católicos se voltaram contra a organização. Afinal, muitos deles não puderam deixar de absorver o espírito do americanismo: de conceitos como liberdade de religião, liberdade de expressão, liberdade de imprensa. Esse sempre foi o dilema de Roma nos EUA – como manter os romanistas americanos fiéis à Roma quando vivem em um país que, em sua essência, é a antítese do que Roma representa? Por exemplo, a Commonweal, a única grande publicação católica a apoiar a decisão da Suprema Corte, declarou que quando os romanistas "obedecem à voz da Igreja, é um ato livre; pressionar ou forçar, mesmo que indiretamente, outros que não creem no mesmo tipo de obediência é pedir servilismo." [352] Essa foi uma excelente declaração em favor da liberdade religiosa e da liberdade de consciência e, como tal, muito americana; mas certamente não estava em harmonia com a "Igreja" de Roma, que exige o mesmo servilismo condenado na declaração e sempre exerceu pressão e força contra aqueles que se opõem à "Igreja".
A Legião da Decência nunca mais seria a instituição todo-poderosa de outrora. Estava apreensiva, mas continuou aplicando os padrões católicos aos filmes que examinava. Isso, por si só, teria sido perfeitamente aceitável se a Legião da Decência o fizesse apenas como um cão de guarda dos católicos americanos, mas ela continuou atuando como se tivesse o direito divino de agir em nome de todos os americanos, católicos ou não.
Não há dúvida, porém, de que a influência e a autoridade da PCA e da Legião foram demasiadamente enfraquecidas em virtude dessas coisas. Ainda eram organizações extremamente fortes, mas, para elas, as coisas não pareciam mais tão cor-de-rosa, tão certas. Os cineastas de Hollywood estavam se tornando mais ousados em seus desafios à interferência da PCA e da Legião.
A Streetcar Named Desire (1951): mais um desafio para o Breen Office e a Legião
O ataque à censura cinematográfica (controlada pelos católicos) continuou. O roteiro de um filme intitulado A Streetcar Named Desire chegou à mesa de Joseph Breen em 1950. A peça homônima da Broadway estava em cartaz desde 1947 e continha temas de sexualidade, homossexualidade, suicídio, sexo entre adultos e adolescentes, estupro, etc. Foi um sucesso estrondoso e, por isso, Hollywood demonstrou interesse em produzir um filme baseado na peça. Era óbvio, porém, que a produção entraria em conflito com a PCA.
Breen se opôs à homossexualidade, à ninfomania e ao estupro, e nunca concederia um selo se esses temas não fosse removidos. Em várias edições, as cenas foram atenuadas, mas não completamente removidas. Não obstante, o selo da PCA foi concedido, surpreendentemente, depois que se chegou a um acordo: Breen disse que aceitaria o tema do estupro se fosse feito "por sugestão e delicadeza", e o diretor Elia Kazan concordou que o final do filme forneceria "valores morais compensadores". [353] Mas quando o padre Patrick J. Masterson, da Legião, e Martin Quigley assistiram ao filme, ficaram furiosos, e a Warner Brothers foi informada pela Legião que condenaria o filme a menos que fossem feitos grandes cortes e alterações. O poder da Legião ainda era tão grande em Hollywood nessa época que a Warner Brothers contratou o próprio Martin Quigley para fazer a edição, em 1951.
Quando o diretor Kazan soube dos grandes cortes que estavam sendo feitos na sala de edição, ele tentou impedir a Legião. Esse mesmo diretor compareceria em breve ao Comitê de Atividades Antiamericanas da Câmara. Mais tarde, ele escreveria em suas memórias: "Foi nessa época que tomei conhecimento da semelhança entre a Igreja Católica e o Partido Comunista, principalmente pela natureza 'clandestina' de suas operações". [354] Nesse ponto, ele estava mais correto do que jamais poderia imaginar. É fato (mas fora do escopo deste livro demonstrar) que os agentes de Roma estavam envolvidos nos bastidores da própria criação do comunismo; que o comunismo havia tomado muito emprestado da instituição católica e que, nos anos seguintes, ambos desenvolveriam um relacionamento cada vez mais confortável e simbiótico.
Quando Kazan confrontou Quigley sobre os cortes em seu filme, Quigley enfatizou a importância da "ordem moral sobre as considerações artísticas". Todos os verdadeiros cristãos concordariam que a moralidade deve ser sempre primordial e que esse filme era flagrantemente imoral; mas é claro que, quando Quigley falou em "ordem moral", ele se referia ao que é entendido e interpretado por Roma. Ele negou isso, naturalmente: Kazan ficou indignado com o fato de a "Igreja" Católica estar impondo seus valores morais a todos os americanos, mas a resposta de Quigley foi que a Legião censurava segundo os Dez Mandamentos. Isso parecia muito mais amplo e mais inócuo do que afirmar que a Legião estava agindo de acordo com os valores morais da "Igreja" de Roma. Mas não era verdade.
Kazan ficou furioso e não permaneceu em silêncio. Em um artigo do New York Times, ele deixou claro que "um proeminente leigo católico" o havia forçado a aceitar as mudanças no filme e escreveu: "Meu filme sofreu cortes para se adequar às especificações de um código que não me representa, não é o código reconhecido da indústria cinematográfica e não é o código da grande maioria do público". Ele também escreveu: "Fui vítima de uma conspiração hostil". Ele classificou Francis Spellman, o cardeal papista, como "o Papa glutão da Quinta Avenida" que o havia humilhado. [355]
Não temos nenhuma simpatia pelos Kazans do mundo. Eles procuram deliberadamente produzir filmes imundos e imorais, um ataque flagrante à decência e à moralidade. Incluímos suas queixas aqui simplesmente para mostrar o poder que Roma exercia em Hollywood naquela época. Os filmes imorais, assim como os livros imorais, não fazem bem algum e causam um imenso dano. Mas a "Igreja" de Roma não tem o direito de ser o cão de guarda moral da sociedade, dada sua história poluída e degradada. Não obstante, durante décadas, o setor cinematográfico foi essencialmente controlado por essa falsa "Igreja".
A retomada do Comitê da Câmara sobre Atividades Antiamericanas em Hollywood
Enquanto tudo isso acontecia, em 1951, as audiências do HUAC foram retomadas repentinamente, após alguns anos de silêncio e inatividade. Dessa vez, um grande número de testemunhas forneceu ao comitê os nomes de associados políticos. Novamente, os magnatas judeus de Hollywood ficaram assustados. Sabiam que, se não demitissem todos os radicais, liberais e comunistas de seus estúdios, enfrentariam piquetes e boicotes a seus filmes e o ódio e a rejeição da sociedade americana. Então, eles agiram. Em seu pânico, chegaram a demitir pessoas que não eram comunistas ou simpatizantes do comunismo, mas cujos nomes constavam da lista negra. Conta-se a história de um roteirista cujo nome estava na lista e que trabalhava para Harry Warner. Warner o demitiu. O homem disse: "Isso é um erro", apresentando documentos que mostravam que ele era anticomunista. "O fato é que eu sou anticomunista." Ao que Warner respondeu: "Não [me importa] que tipo de comunista você é, saia daqui." [356]
The Greatest Show on Earth (1952): a autoridade da Legião ainda mais enfraquecida
Como vimos, a Suprema Corte dos EUA decidiu que era necessário incluir as produções cinematográficas na proteção da liberdade de expressão e que os estados não deveriam ter permissão para censurá-las. A proteção dada pela Primeira e pela Décima Quarta Emendas à Constituição dos EUA agora era estendida aos filmes. Além disso, os próprios cineastas sentiram-se encorajados a desafiar a influência católica em Hollywood, exercida por tanto tempo pela PCA e pela Legião. Em 1953, Samuel Goldwyn, de Hollywood, pediu que o Código de Produção fosse revisado e "razoavelmente atualizado". [357] Outros foram mais contundentes e pediram que o Código e toda a censura fossem eliminados. Até mesmo a publicação papista Commonweal, cujo crítico de cinema era consultor da Legião, agora pedia que o Código fosse revisado. [358]
Um dos cineastas do setor que se sentiu encorajado a desafiar a autoridade da PCA e da Legião após a decisão de 1952 da Suprema Corte foi Cecil B. DeMille, criador de várias produções chamadas de "épicos bíblicos" que não eram nem doutrinariamente sólidos nem moralmente decentes. Agora ele decidiu produzir um filme sobre o circo – o resultado foi The Greatest Show on Earth. A PCA não se opôs, mas a Legião deu ao filme uma classificação "B" (censurável em parte para todos) por causa dos trajes usados pelas mulheres e da caracterização lasciva de um dos personagens masculinos, bem como pelo fato de outro personagem ter realizado o chamado "suicídio assistido" em sua esposa moribunda (embora no final ele tenha sido preso). A classificação "B" significava que o filme não era recomendado para crianças, e DeMille ficou furioso e se recusou a fazer cortes. Ele também observou a Thomas Little, o monsenhor da Legião, que os trajes usados pelas atrizes no filme eram os mesmos usados pelo circo Ringling Brothers and Barnum and Bailey, que era ritualmente abençoado por um padre todos os anos.
DeMille foi apoiado por muitos papistas, incluindo padres, que não viam nada de errado no filme. A desaprovação romanista da classificação da Legião foi expressa por muitos. Um monsenhor, J. B. Lux, providenciou para que quatro monsenhores e vários "leigos" católicos assistissem ao filme. Todos adoraram. Lux disse que a preocupação da Legião com a "eutanásia" era "pura bobagem" e acrescentou que, se a Legião se opusesse a esse filme, os católicos não a levariam mais a sério. Ele foi ainda mais longe, dizendo: "não estamos atrás da cortina de ferro e temos o direito de discordar [da] Legião". [359] Claramente, a autoridade da Legião estava diminuindo gradualmente nos círculos católicos.
A Legião não reconsiderou a classificação, apesar das críticas dos líderes romanistas. No entanto, o filme se saiu muito bem nas bilheterias, e um grande número de católicos levou seus filhos para assisti-lo, como evidenciado pela audiência em redutos papistas como Nova York, Chicago, Baltimore e Pittsburgh. Tornou-se óbvio que um cineasta poderia desafiar a Legião e ainda lucrar muito.
The Moon is Blue (1953): a PCA é ignorada e surgem fissuras na Legião
The Moon is Blue era uma peça da Broadway que estava em cartaz há três anos sem muita reclamação das instituições religiosas, inclusive da instituição romana, apesar de a peça estar repleta de insinuações sexuais em um ambiente de comédia. Uma versão cinematográfica foi planejada, e a United Artists concordou em distribuí-la mesmo que a PCA se recusasse a fornecer um selo e a Legião a condenasse. O roteiro foi enviado à PCA e, obviamente, foi considerado uma violação do Código. Quando o filme em si foi submetido à PCA em 1953, Breen o considerou inaceitável. A MPAA concordou com Breen e o selo foi negado, mas isso porque, se a MPAA concedesse um selo ao filme, a autoridade de Breen, ou o que restava dela a essa altura, teria sido gravemente prejudicada. Eric Johnston, da MPAA, disse em um comunicado: "Em algumas áreas, dentro e fora do setor, há a sensação de que o Código ou algumas partes dele estão fora de moda. Ele é um documento vivo e vibrante que trata de princípios de moralidade e bom gosto. Esses princípios não têm prazo de validade." [360]
Fiel à sua palavra, a United Artists distribuiu o filme mesmo sem o selo. No entanto, o estúdio teve que se desligar da MPAA porque a associação só era permitida àqueles que defendiam o Código.
Martin Quigley concordou com Breen e disse ao estúdio que a Legião condenaria o filme se ele não fosse revisado. Mas os dois padres encarregados da Legião, Patrick J. Masterson e Thomas F. Little, ficaram chocados ao descobrir que um comitê de revisores da Legião da IFCA não se sentiu muito ofendido com o filme e recomendou uma mera classificação "B". Não havia muito nessa classificação para desencorajar as pessoas, inclusive os católicos. Os tempos haviam mudado; os próprios romanistas haviam mudado e já não se sentiam moralmente chocados como antes. A indústria cinematográfica havia sido bem-sucedida em desgastar sua moral.
Mas os dois padres, Masterson e Little, ignoraram as mulheres da IFCA e condenaram o filme. Agiram assim não só porque discordaram da recomendação da IFCA de uma classificação "B", mas também porque Quigley pressionou Masterson para garantir que o filme fosse condenado pela Legião. Quigley o fez porque sua própria credibilidade teria sido abalada se a classificação "B" fosse concedida depois de ele mesmo ter dito ao estúdio que a Legião condenaria o filme.
Quando Masterson morreu repentinamente, Little assumiu o controle da Legião. Ele pediu aos católicos que evitassem The Moon is Blue porque "a força da Legião será testada pelo sucesso ou pelo fracasso comercial desse filme". [361] Ele podia ver a escrita na parede: a autoridade da Legião estava em sérios apuros. Ele conclamou os papistas a protestarem em uníssono contra o filme, e os bispos receberam um sermão para ser dado aos padres sob seu comando. Ele foi apoiado pelo cardeal de Nova York, Spellman, que pediu um boicote, por parte dos papistas, a qualquer cinema que exibisse o filme. Os bispos de Los Angeles e da Filadélfia fizeram eco ao apelo de Spellman, embora a maioria dos bispos dos Estados Unidos não o tenha feito - o que, por si só, já era significativo. A "Igreja" Católica dos Estados Unidos não estava mais falando em uníssono quando se tratava de cinema. O crítico de cinema da Saint Joseph's Magazine, que era o "America's Catholic Family Monthly", elogiou The Moon is Blue, chamando-o até de "saudável". Ainda assim, a pressão católica rendeu dividendos em algumas partes da América. [362] Um padre em El Paso, Texas, informou à Legião que ele havia "colocado o ódio" na rede local que estava exibindo o filme. A Câmara de Comércio Júnior de São Francisco cancelou seu patrocínio para a estreia do filme. Ele foi proibido no Kansas, em Ohio e em Maryland. A polícia de Jersey City prendeu o gerente do cinema e tomou posse de duas cópias do filme. Ao ser liberado, o gerente exibiu uma cópia reserva e "foi ameaçado por alguns bandidos locais". [363] O romanismo não é mais uma igreja "cristã" amorosa.
Mas, por fim, a Legião não foi bem-sucedida. Otto Preminger, o diretor do filme, manteve-se inflexível, recusando-se a fazer qualquer alteração. Stanley Warner e United Paramount, dois dos maiores distribuidores, ignoraram a Legião e reservaram o filme. Embora alguns conselhos de censura estaduais o tenham proibido, outros o aprovaram. E, finalmente, os tribunais anularam todas as decisões de proibir o filme por serem inconstitucionais. Little teve que admitir, com relutância, que a venda de ingressos havia recebido um grande impulso com a condenação da Legião. O filme foi um sucesso estrondoso em todo o país, tendo sido exibido para grandes audiências até mesmo em cidades de católicos convictos, para desgosto de Martin Quigley, que havia ajudado a criar a Legião em 1934. [364]
Foi, de fato, a primeira vez que os católicos, em grande número, se opuseram a uma condenação da Legião. Os padres se juntaram ao povo para se manifestar contra o órgão, expressando o pensamento, outrora praticamente herético, de que ele havia perdido sua utilidade.
A autoridade de Joe Breen também sofreu com o furor causado por The Moon is Blue. Além disso, a Legião ficou cada vez mais apreensiva com a queda dos padrões de Breen. Em 1953, de fato, a Legião criticou Breen por sua maneira de lidar com questões sexuais em várias produções.
Martin Luther (1953): a agenda da Legião exposta
Em 1953, um filme de baixo orçamento sobre a vida do reformador alemão Martinho Lutero foi lançado e, para a surpresa de muitos, tornou-se um sucesso de bilheteria. A produção foi financiada por seis organizações luteranas nos Estados Unidos e não continha temas sexuais, nem imoralidade de qualquer tipo, nem violência. Joe Breen o aprovou, embora a PCA fosse dominada por católicos. Mas a Legião da Decência o condenou.
Isso surpreendeu a muitos. Mas quem entendesse o romanismo não deveria ter ficado surpreso. Martinho Lutero, o monge alemão do século XVI que desafiou a "Igreja" Católica, deu início à Reforma Protestante, o maior golpe que Roma já havia sofrido. Para ela, Lutero era um herege e, portanto, profundamente odiado. A hierarquia papista americana não aprovaria o filme de forma alguma.
No entanto, a Legião enfrentou um dilema. Ela sempre afirmou que sua missão era defender os padrões morais nos filmes, excluindo a imoralidade. Contudo, não havia nada de imoral em Martin Luther. Além disso, a Legião sempre sustentou que seu escopo ia além da mera denúncia de filmes que contradiziam a moral católica. A instituição professava proteger o que chamava de moral cristã em um sentido mais amplo. Ela estava ansiosa para denunciar esse filme, mas o único aspecto que poderia criticar era o fato de retratar Roma desfavoravelmente! A Legião reconheceu que essa condenação não seria aceitável, pois denunciar um filme totalmente moral simplesmente por destacar as falhas de Roma não estava em seu mandato e levaria a uma desaprovação generalizada por parte das organizações protestantes de todo o país. O perigo disso era que muitos descobririam a realidade – que a Legião da Decência estava condenando o filme apenas por ser protestante. Na América protestante isso representava um risco considerável, apesar da influência já expressiva do romanismo na política e na sociedade. A autoridade de Roma era vasta e crescente, mas os Estados Unidos continuavam sendo fundamentalmente uma nação protestante. Não estávamos na Europa da Idade das Trevas.
Percebendo isso, Little, ainda que desejasse condenar o filme como herético e um perigo para os católicos, não teve escolha a não ser emitir outra classificação que não fosse "Condenado". Assim, apesar de muitos papistas terem pedido a Little que condenasse o filme, ele solicitou que a produção fosse classificada na categoria "Separada", que era suficientemente inócua. Isso acabou sendo feito, com a Legião emitindo a advertência aos católicos de que o filme "oferece uma representação simpática e aprovadora da vida e dos tempos de Martinho Lutero, a figura do século XV da controvérsia religiosa [na verdade, ele era uma figura do século XVI]. Contém referências e interpretações teológicas e históricas que são inaceitáveis para os católicos." [365]
A Legião não podia condenar o filme, mas as publicações católicas tinham liberdade para fazê-lo, e o fizeram com grande veemência, acusando-o de ser impreciso, injusto, antibíblico e assim por diante. A condenação mais vigorosa veio do The Wanderer, que acusou o diretor, Irving Pichel, de ter conexões com organizações e atividades de fachada comunistas. Outras publicações romanistas também alegaram que o filme havia sido produzido por comunistas. Essa era uma tática bastante comum usada pelos romanistas naquela época, quando os EUA enfrentavam a ameaça soviética e a instituição católica ainda era fortemente anticomunista. Isso mudaria em poucos anos com a ascensão do pró-comunista João XXIII como papa de Roma, mas no início da década de 1950 a situação era essa. No entanto, o caso dos papistas foi fortalecido, pelo menos na sua perspectiva, quando Allan E. Stone, o homem que escreveu o roteiro, compareceu ao Comitê de Atividades Antiamericanas da Câmara e admitiu que já havia pertencido ao Partido Comunista. Agora as publicações romanistas podiam condenar Martin Luther por ser antiamericano. E elas o fizeram, com veemência.
Contudo, essa forte oposição da Legião não favoreceu sua causa, porque toda a ideia de censura sofria ataques nos EUA naquela época, e esse tipo de vitriolo da Legião só serviu para fortalecer o caso daqueles que se opunham à censura. Além disso, embora muitas instituições protestantes tenham apoiado com frequência a condenação da Legião a vários filmes imorais, elas agora viam essa organização católica sair em disparada contra um filme apenas pelo fato de ser protestante. O argumento de que o filme era parte de uma conspiração comunista internacional também não ajudou a causa da Legião. Apenas a fez parecer tola. [366] Para muitas pessoas, era óbvio agora que a Legião da Decência não estava apenas preocupada com questões de moralidade, mas com o avanço da agenda católica. Esse foi o período anterior ao Concílio Vaticano II e ao movimento ecumênico – os protestantes ainda viam o romanismo com profunda suspeita (e com razão} e estavam bem mais cientes do desejo de Roma de dominar os Estados Unidos do que os protestantes atuais. A reação histérica da Legião a Martin Luther apenas provou que eles estavam certos.
I Confess (1953): filme pró-papista de um diretor educado por jesuítas
No entanto, embora a mudança estivesse no ar, católicos influentes em Hollywood ainda faziam muito para promover sua religião por meio do cinema. Um deles foi o diretor jesuíta Alfred Hitchcock, cujo filme I Confess procura glorificar o sacramento da confissão e as tentativas de um padre de nunca violar o sigilo do confessionário, até mesmo com o sacrifício de sua própria vida, se necessário. O padre da trama está ligado a um crime, mas não pode limpar seu nome sem violar a confidencialidade do confessionário. O filme certamente glorifica tanto o sacerdócio quanto o sacramento papal.
The French Line (1953): torcendo o nariz para os censores
Em 1953, The French Line foi lançado por Howard Hughes, estrelado por Jane Russell. Breen havia aprovado o roteiro, mas avisou Hughes que as atrizes deveriam estar devidamente cobertas quando o filme fosse produzido. Quando o filme ficou pronto, Breen percebeu que Hughes havia ignorado sua advertência e a RKO, o estúdio de Hughes, teve o selo negado.
Mas Hughes fez o que antes seria totalmente impensável: ele simplesmente ignorou Breen e a diretoria da MPAA (a RKO era membro da MPAA, portanto essa foi uma rebelião deliberada) e lançou o filme ao público. Além disso, ele deliberadamente agendou a estreia mundial do filme para St. Louis - a cidade natal do padre jesuíta Daniel Lord, o autor do Código de Produção, e com uma grande população católica!
Hughes estava desafiando deliberadamente a PCA e a MPAA, e elas sabiam disso. Breen aplicou uma multa de US$ 25.000 a Hughes porque a RKO pertencia à MPAA, mas para um multimilionário como Hughes isso era um tapa ineficaz no pulso. Breen enviou o membro da equipe da PCA, Jack Vizzard, para planejar o que fazer a respeito com o arcebispo Joseph E. Ritter. Eles sabiam muito bem o que estava em jogo, pois o próprio Vizzard disse: "O que estava em jogo era a sobrevivência de todo o sistema, e até mesmo de todo o conceito, de alcançar a decência no cinema. Um avanço bem-sucedido de Hughes, explorando a protuberância criada por Preminger, significaria a ruína de todo o experimento." [367] Por "decência no cinema", Vizzard queria dizer, essencialmente, a imposição da moralidade católica e o controle dos filmes. É preciso sempre ler essas declarações dos romanistas, especialmente os influenciados pelos jesuítas como Vizzard, no sentido em que eles as querem dizer.
Quando o arcebispo perguntou a Vizzard se ele achava que deveria ser emitida uma carta pastoral proibindo os católicos de assistirem ao filme sob pena de cometerem pecado mortal, Vizzard respondeu que essa era uma boa ideia, embora, em particular, achasse que estava indo longe demais. Quanto à Legião, o padre Little disse a Hughes que, a menos que ele retirasse o filme de cartaz imediatamente, a Legião o condenaria. Quando Hughes enviou uma cópia do filme para a Legião para análise, os críticos o condenaram e disseram a Hughes que era preciso fazer cortes severos.
Hughes tentou fazer com que Breen reconsiderasse sua posição, enviando novamente uma nova versão para sua avaliação. Mas Breen se recusou a ceder, e Hughes então disse à Legião que não cancelaria seu filme nem faria nenhuma outra alteração importante apenas para agradar à Legião.
O arcebispo Ritter não reagiu bem quando soube que o presidente dos estúdios RKO de Hughes, James Grainger, era um católico e que o filho de Grainger, Edmund, havia produzido o filme! Ritter ficou furioso com o fato de os católicos estarem tão moralmente degenerados a ponto de se envolverem com Hughes na produção de The French Line. O cardeal Spellman disse que repreenderia esses romanistas. [368] James Grainger disse a Little que, no que lhe dizia respeito, a Legião não estava sendo justa com Hughes e era muito direta quando se tratava de questões sexuais e da exposição da forma feminina na tela. Ele ressaltou que em países católicos, como a Itália e a França, era aceitável que os espectadores vissem mais da forma feminina do que era permitido nos Estados Unidos. [369]
A Legião foi em frente e condenou o filme como obsceno, insinuante, indecente e ofensivo; e Little pediu aos bispos que pressionassem as salas de cinemas locais para que não o exibissem.
Vizzard, o arcebispo Ritter e o padre John Cody tentaram fazer com que grupos protestantes e judeus se unissem aos católicos em manifestações contra o filme, mas sem sucesso. Então, eles enviaram uma carta a todos os padres da diocese de St. Louis, dizendo que esse filme prejudicaria irreparavelmente a Legião e a PCA e conclamando os papistas a fazer do filme um fracasso de bilheteria. Em seguida, Ritter fez o que Vizzard havia aconselhado: declarou em uma carta lida em todas as missas realizadas na diocese que assistir ao filme era um "pecado mortal", a forma mais grave de pecado conhecida pelos papistas, pelo qual eles acreditam que irão para o inferno se não o confessarem a um padre.
No entanto, a Legião havia aprendido com os erros do passado. Ela percebeu que piquetes barulhentos de romanistas furiosos do lado de fora dos cinemas gerariam, na verdade, mais publicidade para o filme, então, dessa vez, os padres foram até os proprietários dos cinemas e simplesmente pediram gentilmente que não o exibissem. Se o cinema o exibisse mesmo assim, os padres deveriam fazer "um apelo moderado e sincero" de seus púlpitos para que o povo ficasse longe do cinema. [370] Na verdade, Roma percebeu que a mudança dos tempos demandava uma mudança nas táticas. Eles sabiam que os dias em que os padres usavam o peso de sua influência tinham terminado, pelo menos momentaneamente. Roma teria que adotar uma abordagem mais sutil, mais gentil. Isso contrariava sua natureza, mas ela não tinha escolha.
Para o caso de alguém ficar tentado a pensar que essa abordagem mais gentil era genuína, considere o seguinte: enquanto publicamente os padres agiam com gentileza e cortesia, em particular eles descobriam quais proprietários de cinema eram católicos e então pressionavam, recusando-se (por exemplo) a administrar os sacramentos ao proprietário. Para um papista, isso significa ser excluído da "Igreja" e estar sujeito à condenação eterna. Naturalmente, é um fato reconhecido que qualquer igreja ou "igreja" professa tem o direito de exigir de seus membros fidelidade doutrinária. Mas agir dessa forma, sorrindo publicamente e ameaçando em particular, foi hipócrita, astuto, sinistro e desagradável. Não obstante, era algo normal no que dizia respeito à Roma.
Além disso, de acordo com o gerente do Cinema Lafayette, em Buffalo, Nova York, milhares de cartas e telefonemas foram recebidos de católicos que se opunham ao filme, mas essas cartas incluíam algumas das "linguagens mais vulgares, obscenas e imorais já proferidas", disse ele à revista Variety. [371] Os católicos condenavam piedosamente vários filmes reconhecidamente imorais, mas em sua própria vida pessoal eram frequentemente hipócritas e imorais!
Embora os prelados do alto clero continuassem a condenar o filme e a declarar que assisti-lo era um pecado mortal, e ainda que muitos cinemas e condados se recusassem a exibi-lo por causa de sua obscenidade, a audiência foi enorme, mesmo em áreas fortemente papistas, não obstante as ameaças de seus líderes religiosos, fato admitido pelo próprio padre Little em seu relatório anual aos bispos. [372] O filme faturou muito e foi um sucesso de bilheteria. Teria rendido ainda mais se Hughes tivesse se submetido à PCA e à Legião, mas ele não o fez, preferindo torcer o nariz para os censores e, assim, cravar mais um prego no caixão da censura cinematográfica controlada pela Igreja Católica nos Estados Unidos.
On the Waterfront (1954): romanismo social e elogios aos padres operários jesuítas
Contudo, mesmo durante o crepúsculo do domínio de Breen em Hollywood, havia produções que ainda transmitiam uma imagem positiva (embora mutável) do romanismo americano. Um deles é On the Waterfront, de Elia Kazan, descrito como "um hino a uma Igreja socialmente consciente". [373]
O roteiro foi parcialmente baseado em uma série de histórias de Malcolm Johnson, que destacava o trabalho de dois padres jesuítas, Philip A. Carey e John M. Carridan. O roteirista Bud Schulberg, que se autodenominava "livre-pensador liberal", ficou profundamente impressionado com o ardente jesuíta Carridan, um "irlandês, de fala rápida, fumante inveterado, cabeça dura e às vezes profano". Carridan falava de revolução, reconstrução, justiça social, caridade "cristã" (ou seja, papista) e poder sindical. Esse era o tipo de sacerdote com o qual Schulberg se identificava, um sacerdote tão pouco sacerdotal (para aquela época) que Kazan, em certo momento, chamou Schulberg de lado e lhe perguntou: "Tem certeza de que ele é um sacerdote?" [374] Essa foi a época em que os "padres operários" de inspiração comunista estavam ganhando terreno, e os jesuítas estavam frequentemente na linha de frente. Era uma época em que a "Igreja" de Roma, ainda sob o comando de um papa anticomunista (Pio XII), começava a mudar de lado, tornando-se cada vez mais pró-comunista. [375] O catolicismo passou a jogar seu enorme peso em favor dos "trabalhadores do mundo". Os padres operários eram agitadores, do lado dos "operários", e muitas vezes eram vistos como "homens dos homens", não apenas com conhecimento do mundo, mas também do mundanismo, o que incluía palavrões e bebedeira. Tudo isso visava convencer as classes trabalhadoras de que o padre era "um deles". E funcionou.
Foi assim que o padre foi retratado em On the Waterfront, inspirado no jesuíta Carridan. Além disso, outro personagem do filme, um operário do estaleiro, é representado como uma figura de Cristo, e há um paralelo muito óbvio com a crucificação de Cristo.
Mas, apesar de produções como essa, o mundo estava em constante mutação. E Breen viu a escrita na parede.
A batalha está perdida: Joseph Breen se aposenta
Joseph Breen não era mais capaz de encarar a tarefa. Ele havia levado uma surra e estava sentindo isso. Em 1954, decidiu se aposentar da Production Code Administration, que havia dirigido por duas décadas. Ele havia procurado impor sua moralidade católica em Hollywood e durante anos foi bem-sucedido. A citação a seguir resume bem sua influência: "Joseph Breen teve mais influência sobre o conteúdo e a estrutura dos filmes do que qualquer outra pessoa na longa história de Hollywood. De 1934 a 1954, a era de ouro da produção em estúdio, os produtores enviaram mais de sete mil roteiros e filmes para sua inspeção. Sua palavra era lei durante esse longo reinado.... Sem Breen e sua visão do código, os filmes dessa época teriam tido uma aparência, estrutura e sensação muito diferentes." [376]
Ao longo dos anos, Breen foi agraciado com inúmeras honrarias de sua "Igreja". Em 1937, a Loyola University of Los Angeles lhe conferiu um diploma honorário, seguido pela St. Joseph's University em 1954. Um de seus momentos mais queridos foi sua nomeação a Cavaleiro Comandante da Ordem de São Gregório pelo Papa Pio XI durante uma cerimônia realizada no Vaticano. "O homem que entrou na boca do dragão em Hollywood foi literalmente apelidado de cavaleiro." [377]
Ele lutou longa e arduamente por Roma e foi extremamente bem-sucedido. O domínio romanista na "Era de Ouro" de Hollywood foi atribuído principalmente a Breen. Mas agora era uma época diferente. Como a revista Variety declarou em 1954, "Hollywood está tendo uma visão diferente da 'moralidade' da tela e, como resultado, mudanças marcantes na interpretação do Código de Produção estão a caminho. De certa forma, a indústria cinematográfica está embarcando em uma nova era, pois até mesmo o símbolo dos padrões da velha guarda das telas - o administrador do Código, Joseph I. Breen - está mudando " [378].
Em março de 1954, Breen compareceu à cerimônia anual do Oscar em Los Angeles e recebeu um prêmio honorário da Academia por "sua gestão consciente, aberta e digna do Motion Picture Production Code". [379] Foi o "tributo" superficial da indústria cinematográfica a um homem que lutou durante anos para controlar rigidamente o setor. Obviamente, o prêmio foi dado mais como um gesto formal do que por qualquer gratidão sincera. Na verdade, os magnatas de Hollywood nunca teriam considerado a censura de Breen como "gestão consciente".
A Legião da Decência e Joseph Breen trabalharam em estreita colaboração ao longo dos anos. Embora às vezes discordassem, ele e a Legião geralmente se entendiam e cooperavam para exercer sua influência católica sobre Hollywood.
Com a saída de Breen, o domínio católico irlandês do setor chegou ao fim.
Nota adicional
a. Ao contrário do que a tradução da King James (ou da ARA) parece sugerir, a passagem não apoia a ideia de que Deus predeterminou o destino final das pessoas. No grego, a expressão "foram ordenados" (ou "destinados") admite o sentido de "designaram a si mesmos" ou "se dispuseram", em harmonia com o contexto imediato; no verso 46, os judeus se mostraram indignos da vida eterna por terem rejeitado o evangelho, ao passo que os gentios manifestaram o desejo de ser considerados dignos.
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