A Questão Romana - 18. Por que o Papa nunca terá Soldados

 
Fiz uma visita a um prelado romano conhecido por sua devoção aos interesses da Igreja, ao poder temporal dos papas e à pessoa augusta do Santo Padre.

Quando fui apresentado à sua oratória, encontrei-o lendo as provas de um grosso volume, intitulado Administration of the Military Forces. Ele largou a pena com ar de desânimo e mostrou-me as duas citações seguintes que havia inscrito na página de título do livro:

"Todo Estado independente deve bastar-se a si mesmo e garantir sua segurança interna por suas próprias forças." — Conde Rayneval; nota de 14 de maio de 1855.

"As tropas do papa serão sempre as tropas do papa. O que são guerreiros que nunca guerrearam?" — De Brosses.

Depois de ter refletido um pouco sobre essas passagens pouco consoladoras, o prelado disse: "Você não ficou muito tempo em Roma e suas impressões devem ser justas, porque são recentes. O que você acha dos nossos romanos? Os descendentes de Marius lhe parecem uma raça sem coragem, incapaz de enfrentar o perigo? Se é verdade que a nação não reteve nada de seu patrimônio, nem mesmo sua coragem física, todos os nossos esforços para criar uma força nacional em Roma estão fadados ao fracasso. Os papas devem permanecer para sempre desarmados na presença de seus inimigos. Nada lhes resta senão entrincheirar-se atrás da coragem mercenária de uma guarnição suíça ou da respeitosa proteção de uma grande potência católica. O que acontece com a independência? O que vem a ser a soberania?"

– "Monsenhor", respondi, "já conheço os romanos bem demais para julgá-los pelas calúnias de seus inimigos. Vejo diariamente com que coragem destemperada esse povo violento e de sangue quente dá e recebe a morte. Sei o quanto Napoleão I estimava os regimentos que ele criou aqui. E podemos dizer entre nós que havia muitos súditos do papa no exército revolucionário que defendiam Roma contra os franceses. Estou, portanto, convencido de que o Santo Padre não precisa recorrer ao exterior para formar regimentos e que alguns anos de educação bastariam para transformar esses homens em soldados. O que é muito menos evidente para mim é a necessidade real de um exército romano. O papa quer engrandecer-se através da guerra? Não. Ele teme que algum inimigo invada seus estados? Certamente não. Ele está mais protegido pela veneração da Europa do que por uma linha de fortalezas. Se, por uma eventualidade quase impossível, surgisse alguma diferença entre a Santa Sé e uma monarquia italiana, o papa tem os meios de resistência à mão, sem desferir um golpe; pois ele conta com mais soldados no Piemonte, na Toscana e nas Duas Sicílias, do que os napolitanos, os toscanos e os piemonteses poderiam enviar contra ele. Tanto para o exterior – e a situação é tão clara que seu ministério da guerra assume o modesto e cristão título de ministério das armas – quanto para o interior, basta uma boa gendarmeria."

– "Eh, meu querido filho!", exclamou o prelado, "não pedimos nada melhor. Um povo que não está destinado a fazer a guerra não deve ter um exército, mas deve reunir as forças necessárias para manter a paz pública. Um exército policial e de segurança interna é o que temos procurado criar desde 1849. Conseguimos? Somos autossuficientes? Estamos em condições de garantir nossa tranquilidade por nossas próprias forças? Não! Não! Certamente não".

– "Perdoe-me, monsenhor, se o acho um pouco severo. Durante os três meses que passei como observador em Roma, tive tempo de ver o exército pontifício. Seus soldados são homens de boa aparência, seu aspecto geral é bom, eles têm um ar marcial e, até onde posso julgar, executam suas manobras muito bem. Seria difícil reconhecer neles o velho soldado do papa, o personagem fabuloso cujo dever era escoltar as procissões e disparar o canhão nas noites de fogos de artifício; esse cidadão próspero de uniforme que, se o tempo parecesse ameaçador, montava guarda com um guarda-chuva. O exército do Santo Padre apresentaria uma boa aparência em qualquer país do mundo; e há alguns de seus soldados que eu tomaria por uns dos nossos, se não os olhasse com muita atenção."

– "Sim", disse ele, "sua aparência é boa o suficiente e, se as facções pudessem ser controladas por meras aparências, eu me sentiria toleravelmente tranquilo. Todavia sei muitas coisas a respeito do exército que me causam muito desconforto, e ainda assim não sei tudo. Sei que recrutar soldados e até oficiais é difícil; que jovens de boa família desprezam comandar o exército, e lavradores desdenham servir nele. Sei que mais de uma mãe prefere ver o filho nas galés do que no regimento. Sei que nossos soldados, em sua maioria provenientes da escória do povo, não têm confiança em seus camaradas, nem respeito por seus oficiais, nem veneração por sua bandeira. Você procuraria em vão encontrar entre eles devoção ao seu país, fidelidade ao seu soberano e todas aquelas virtudes elevadas e guerreiras que fazem um homem morrer em seu posto. Para a maioria, as leis do dever e da honra são letra morta. Sei que o gendarme nem sempre respeita a propriedade privada. Sei que as facções contam, pelo menos tanto quanto nós, com o apoio do exército. De que adianta ter quatorze ou quinze mil homens a pé e gastar alguns milhões anualmente, se depois de tantos esforços e sacrifícios a proteção estrangeira nos é agora mais necessária do que no primeiro dia?"

– "Monsenhor", respondi, "você coloca as coisas sob a pior luz possível e julga a situação um pouco à maneira do profeta Jeremias. O Santo Padre tem vários oficiais excelentes, tanto no corpo especial como nos regimentos de linha, e você também tem alguns bons soldados. Os nossos oficiais, que são homens competentes, fazem justiça aos de vocês, tanto pela sua inteligência como pela sua boa vontade. Se algo me surpreende é que o exército pontifício tenha feito tantos progressos nas condições deploráveis em que se encontra. Podemos falar sobre isso livremente, pois tudo é questionado e está prestes a ser reorganizado pelo chefe do estado. Você se queixa de que jovens cavalheiros de boa família não se aglomeram na Escola de Cadetes na esperança de ganhar uma dragona. Mas você se esquece de quão pouco a dragona é honrada entre vocês. O oficial não tem posto no estado. Diz-se que um diácono está acima de um subdiácono, mas a lei e o costume de Roma não admitem que um simples tonsurado esteja abaixo de um coronel. Que posição você atribui a seus generais? Qual é a posição deles na hierarquia?"

– "Mas não temos generais no exército. Só os temos à frente de ordens religiosas. O que diria o general dos jesuítas se visse um soldado ostentando-se grotescamente com tão honroso título?"

– "Você me faz pensar sobre isso."

– "Para termos comandantes à frente de nossas tropas, sem ao mesmo tempo criar personagens de muita importância, trouxemos três coronéis estrangeiros, que estão autorizados a exercer as funções de general. Até aparecem disfarçados de generais, mas nunca terão a audácia de assumir o título."

– "Ótimo! Bem, agora entre nós não há um garoto de dezoito anos que se alistaria no exército se lhe dissessem que poderia se tornar um coronel, mas nunca um general; ou mesmo um general, mas nunca um marechal da França. Quem, ou o quê, poderia induzir um homem a se precipitar em uma carreira na qual existe, em certo ponto, uma barreira intransponível?

“Você lamenta que todos os seus oficiais não sejam sábios. Me admira que tenham aprendido alguma coisa. Eles entram na Escola sem concurso ou exame preliminar, às vezes sem saber ortografia ou aritmética. A primeira inspeção feita por nossos generais descobre futuros tenentes que não sabem fazer um cálculo de divisão, que fizeram um curso de francês sem mestre ou alunos e uma aula de história em que, após sete meses de ensino, o professor ainda expõe teologicamente a criação do mundo. De fato, deve ser um poderoso espírito de emulação que induz esses jovens a se tornarem capazes de manter uma conversa com os oficiais franceses. Você fica surpreso que eles permitem que a disciplina de seus homens se torne um tanto relaxada. Ora, a disciplina é a última coisa que lhes foi ensinada. Na época de Gregório XVI, um oficial se recusou a permitir que a carruagem de um cardeal passasse por uma determinada rua. Tais eram suas ordens. O cocheiro partiu, e o oficial foi mandado para o castelo de Santo  Ângelo, por ter cumprido o seu dever. Uma única ocorrência desse tipo é suficiente para desmoralizar um exército. Mas o próprio rei de Nápoles questionaria os papas sobre esse assunto. Ele colocou na ordem do dia uma simples sentinela que havia arrancado o cocheiro de um bispo!

"Você está escandalizado porque certos administradores militares reduzem a pobre ração de pão dos soldados; mas nunca lhes foi dito que peculato será punido com expulsão."

– "Bem, o plano de reformas está sendo elaborado e você verá uma nova ordem de coisas em 1859."

– "Tanto melhor, monsenhor; e garanto que uma reorganização sábia, comedida, lentamente progressiva, como tudo o que se faz em Roma, produzirá resultados admiráveis ​​em poucos anos. Não é da noite para o dia que podemos mudar a face das coisas; mas você sabe que o agricultor não se desanima porque a árvore que planta hoje só produzirá frutos depois de cinco anos. A moral de seus soldados, como você diz, não é das melhores. Ouço dizer em todos os lugares que um camponês honesto acha uma desonra usar seu uniforme. Quando você puder oferecer um futuro a seus homens, não precisará mais recrutá-los da escória da sociedade. O soldado terá algum sentimento de dignidade pessoal quando deixar de se ver exposto ao desprezo. Esses pobres coitados são desprezados por todos, até mesmo pelos empregados de famílias pequenas. Eles respiram uma atmosfera de escárnio, que pode ser chamada de malária da honra. Alivie-os, monsenhor; eles não pedem nada melhor."

– "Você acredita, então, que há meios de nos dar um exército tão orgulhoso e tão leal quanto o exército francês? Esse é um segredo pelo qual o cardeal pagaria um alto preço!"

– "Eu o ofereço a você de graça, monsenhor. A França sempre foi o país mais militar da Europa; mas, no século passado, o soldado francês não era melhor que o seu. Os oficiais pouco mudaram, exceto que o rei os escolheu entre a nobreza, e que hoje se enobrecem pelo trabalho e pela coragem. Porém a tropa francesa propriamente dita consistia há cem anos da mesma estirpe da qual vocês recrutam hoje seus soldados: a escória do povo. Apanhado em cabarés entre uma pilha de moedas e um copo de conhaque, o soldado fazia-se mais temido pelos camponeses do que pelo inimigo. O desprezo do povo, a baixeza de sua condição, a impossibilidade de subir na hierarquia pesavam sobre seus ombros, e ele se vingava de tudo no porão e no curral. Ele teve seu lugar entre os flagelos que desolaram a França monárquica. Ouça o que La Fontaine diz:

'La faim, les créanciers, les soldais, la corvée, Lui font d'un malheureux la peinture achevée.'

"Note que seus soldados de 1858 são anjos em comparação com nossos soldados da monarquia. Se, com tudo isso, você achar que ainda não são perfeitos, experimente a receita francesa: submeta todos os seus cidadãos ao recrutamento, para que seus regimentos não sejam compostos pelo refugo da nação. Crie…"

– "Pare!", exclamou o prelado.

– "Monsenhor?"

– "Meu filho, devo interrompê-lo, porque percebo que você está indo além do real e do possível. Primeiro, não temos cidadãos aqui, mas súditos. Segundo, o recrutamento é uma medida revolucionária que não adotaremos em hipótese alguma; consagra um princípio de igualdade tão contrário às ideias do governo quanto aos costumes do país. Isso poderia nos dar um exército muito bom, mas esse exército pertenceria à nação, não ao soberano. Descartemos imediatamente esta perigosa utopia, por favor."

– "Talvez você ganhe alguma popularidade."

– "Longe disso! Acredite em mim, os súditos do Santo Padre têm uma profunda antipatia pelo princípio do recrutamento. O descontentamento de La Vendée e da Bretanha não é nada comparado ao que criaria aqui."

– "As pessoas se acostumam com tudo, monsenhor. Encontrei contingentes de La Vendée e da Bretanha cantando alegremente enquanto se juntavam às suas divisões."

– "Tanto melhor para eles. Mas deixe-me dizer-lhe que a única queixa deste país contra o domínio francês é o recrutamento, que o imperador estabeleceu entre nós."

– "Então você rejeita minha proposta de recrutamento."

– "Absolutamente!"

– "Não devo pensar mais nisso?"

– "Está fora de questão."

– "Pois bem, monsenhor, eu a retiro. Recorramos ao sistema de alistamento voluntário, mas com a condição de que assegure as perspectivas do soldado. Que recompensa você oferece aos recrutas?"

– "Doze coroas; mas no futuro pretendemos chegar a vinte."

– "Vinte coroas é o suficiente. Ainda assim, temo que mesmo com 107 francos por cabeça você não conseguirá homens escolhidos. Admita, monsenhor, um camponês deve estar desprovido de recursos pela soma de 20 coroas para decidir usar um uniforme desprezado! Mas se você quiser atrair mais recrutas para cada quartel do que pretendentes no portão de Penélope, dote o exército, ofereça aos cidadãos romanos – perdoe-me, refiro-me aos súditos do papa – uma recompensa que realmente os seduza. Pague-lhes uma pequena quantia para a assistência de suas famílias e mantenha o soldo até que seu período de serviço tenha expirado. Induza-os a se engajar novamente após a dispensa por meio de promessas honradas e fielmente cumpridas; faça com que, a cada ano adicional de serviço, aumentem as economias que o soldado deixou nas mãos do estado. Acredite em mim, quando os romanos souberem que um soldado, sem apoio, sem educação, sem um golpe de brilhantismo e sem um golpe de sorte, pela única fidelidade de seus serviços, pode garantir, em 25 anos, 500 ou 600 francos de renda, eles disputarão a vantagem de entrar nas fileiras. E garanto-lhe que o interesse pessoal de cada um os vinculará mais firmemente ao governo, como depositário de suas economias. O burguês mais indiferente e obeso, se visse seu cartório pegando fogo, correria pelos telhados como um gato para apagar o incêndio. Em virtude do mesmo princípio, um governo tem tanto mais a esperar de seus servidores quanto eles devem esperar dele.”

– "Claro", disse o prelado, "entendo perfeitamente seu argumento. O homem requer algum objeto na vida. Uma renda de 120 coroas é uma aposentadoria muito agradável no final de uma carreira militar. A esse preço, não sentiríamos mais falta de candidatos. A própria classe média solicitaria o emprego de soldado com a mesma disposição que as funções civis, e poderíamos escolher. É a despesa que me assusta."

– "Ah, monsenhor! Você sabe que um artigo realmente bom nunca deve ser barato. O governo pontifício tem 15.000 soldados por £ 400.000. A França pagaria a metade por eles, mas então ela teria o valor do custo extra. Os homens que cumpriram dois ou três termos de serviço são os que custam mais dinheiro; e, no entanto, é econômico mantê-los, porque cada homem vale três recrutas. Então você deseja ou não criar uma força nacional? Já se decidiu sobre o assunto? Se você deseja, deve pagar por isso e fazer os sacrifícios necessários. Se, ao contrário, seu governo prefere a economia à segurança, comece economizando as 400.000 libras do orçamento do exército e venda a algum país estrangeiro os 15.000 fuzis que são mais perigosos do que úteis, pois você não sabe se serão usados a seu favor ou contra você. A questão pode ser resumida em duas palavras: segurança, que vai te custar dinheiro; ou economia, que pode custar sua existência!"

– "Você está propondo um exército de pretorianos."

– "O nome não é a questão. Só prometo que, se pagar bem aos seus soldados, eles serão leais a você."

– "Os pretorianos frequentemente se voltavam contra os imperadores."

– "Porque os imperadores foram tolos o suficiente para pagar-lhes em espécie."

– "Mas há alguma motivação neste mundo mais nobre do que o interesse? E não é o dinheiro o único laço duradouro que une os soldados ao seu estandarte?"

– "Eu não seria um francês, monsenhor, se tivesse tal crença. Eu o aconselhei a aumentar o salário de seus soldados, porque até agora seu exército foi recrutado apenas com dinheiro; e também porque o dinheiro é aquilo que lhe custa menos e, consequentemente, aquilo de que você mais voluntariamente se desfará. Bem, agora que você me deu os poucos milhões necessários para reunir seus soldados ao governo pontifício, forneça-me os meios de estabelece-los em sua própria estimativa e na do povo. Honre-os, para que se tornem homens de honra. Prove a eles, pela consideração com que você os cerca, que eles não são lacaios e que não devem ter a alma de lacaios. Dê a eles um lugar no estado; confira ao seu uniforme um pouco do prestígio que agora é privilégio exclusivo da veste clerical."

– "Você sabe o que está pedindo?"

– "Nada além do que é absolutamente necessário. Lembre-se, monsenhor, que este exército, convocado para atuar no interior dos estados pontifícios, o servirá menos pela força das suas armas do que pela autoridade moral da sua presença. E diga-me, que autoridade o exército pode ter aos olhos de seus súditos, se o governo vier a desprezá-lo?"

– "Mas, supondo que obtenha todo o pagamento e toda a consideração que você reivindica para isso, ainda assim permanecerá aberta a observação do presidente de Brosses: 'O que são guerreiros que nunca guerrearam em suas vidas?'"

– "Eu admito. A consideração que todos os franceses têm pelo soldado tem sua origem na ideia dos perigos que ele enfrentou ou pode enfrentar. Vemos nele um homem que sacrificou sua vida de antemão, comprometendo-se a derramar cada gota de seu sangue a uma palavra de seus superiores. Se as criancinhas de nosso país saúdam respeitosamente a bandeira, este campanário regimental, é porque estão pensando em todas as pessoas de bom coração que caíram ao seu redor."

– "Talvez, então, você pense que devemos enviar nossos soldados para a guerra, antes de empregá-los como guardiões da paz?"

– "É certo, monsenhor, que sempre que se vê um velho soldado da Criméia que se infiltrou em um dos regimentos estrangeiros do papa, a medalha que traz no peito o faz parecer um homem bem diferente de qualquer um de seus camaradas. Qual corpo do seu exército o povo tratou com respeito? Os carabinieri papais, porque originalmente foram escolhidos entre os ex-soldados de Napoleão."

– "Meu amigo, você não respondeu à minha pergunta. Você exige que declaremos guerra contra a Europa para ensinar nossos gendarmes a manter a paz em casa?"

– "Monsenhor, o governo de Sua Santidade é muito prudente para sair em busca de aventuras. Não estamos mais nos dias de Júlio II, que vestiu a couraça, prendeu a espada ao corpo e saltou para a trincheira. Mas por que o chefe da Igreja não deveria fazer como Pio V, que enviou seus marinheiros com os espanhóis e venezianos para a batalha de Lepanto? Por que não destacar um ou dois regimentos para a Argélia? A França talvez lhes desse um lugar em seu exército; eles podem se juntar a nós no avanço da sagrada causa da civilização. Tenha certeza de que quando essas tropas regressarem depois de cinco ou seis campanhas, ao mais modesto dever de preservar a paz pública, todos os obedeceriam com cortesia. Os lacaios vulgares não ousariam mais fazer uso de expressões como a que ouvi ontem à noite na porta de um teatro: 'Atenha-se à sua condição de soldado e deixe o trabalho de servo para mim!' Aqueles que os desprezam agora, ficariam orgulhosos de mostrar-lhes respeito, pois as nações tendem a admirar a si mesmas nas pessoas de seus exércitos."

– "Por quanto tempo?"

– "Para sempre. A glória adquirida é um capital que nunca se esgota. E esses regimentos nunca perderiam o espírito de honra e disciplina que trariam da guerra. Você não sabe, monsenhor, o que é uma ideia incorporada em um regimento. Há todo um mundo de lembranças, tradições e virtudes circulando, visíveis e invisíveis, em meio a esse grupo de homens. É o patrimônio moral da tropa; os veteranos não o carregam quando se aposentam do serviço, enquanto os recrutas o herdam desde o dia em que ingressam no regimento. O coronel, os oficiais e os soldados rasos mudam um após o outro e, no entanto, é o mesmo regimento que sempre permanece, porque o mesmo espírito continua a vibrar entre as dobras da mesma bandeira. Tenha quatro bons regimentos de homens escolhidos, bem pagos, devidamente respeitados e que estiveram sob fogo, e eles durarão tanto quanto Roma, e o próprio Mazzini não prevalecerá contra sua coragem."

– "Que assim seja! E que o céu te ouça!"

– "Ouvir-me, monsenhor, já é metade do caminho. Não estamos longe do Vaticano, onde está o verdadeiro ministro das armas."

– "Ele insistirá em outra objeção."

– "Qual será?"

– "Que se ele enviar nossos regimentos para servir como aprendizes na África, eles trarão de volta as ideias francesas."

– "Isso é um acidente impossível de evitar. Mas console-se com a reflexão de que é irrelevante se as ideias francesas são trazidas para o seu país por seus soldados ou pelos nossos. Além disso, essa mercadoria que escapa tão bem da alfândega logo será abundantemente fornecida pelas ferrovias. E afinal, onde está o grande mal? Todos os homens que nos estudaram sem preconceito sabem que as ideias francesas são ideias de ordem e liberdade, de conservadorismo e progresso, de trabalho e honestidade, de cultura e indústria. O país onde mais abundam as ideias francesas é a França, e a França, monsenhor, goza de boa saúde."




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