A natureza da obra final de Cristo em Seu santuário



A centralidade do Dia da Expiação no Pentateuco e no próprio livro de Levítico demonstra a suprema importância da derradeira obra que então se realizava nesse dia em favor do santuário e do povo, algo que deve absorver toda a nossa atenção.


Nos serviços diários, os pecados confessados ao longo do ano eram figuradamente transferidos para o tabernáculo por meio da manipulação ritual do sangue da oferta pelo pecado, indicando que, embora o pecador recebesse o perdão e a justificação da parte de Deus com base na promessa, o problema da existência do pecado permanecia sem solução.

A cerimônia anual da expiação lidava com esse problema, realizando uma obra de remoção de pecados, não executada pelo serviço diário.

A purificação do santuário como um todo e de cada israelita contrito constituía, com efeito, o ato mais importante do ministério sumo-sacerdotal. Era o clímax dos serviços levíticos, o dia mais solene e sagrado do calendário religioso hebreu, para o qual o povo de Israel olhava com grande solenidade e expectativa. Para eles, o Dia da Expiação era o tempo do acerto de contas com Deus, um dia de julgamento realizado em seu favor, de vindicação cabal do santuário e do povo. Não admira que fosse um dia de separação, distinto de todos os demais dias, à semelhança do sábado semanal, destinado a beneficiar todos os crentes.

Porque, naquele dia, se fará expiação por vós, para purificar-vos; e sereis purificados de todos os vossos pecados, perante o Senhor. É sábado de descanso solene para vós outros, e afligireis a vossa alma; é estatuto perpétuo. Quem for ungido e consagrado para oficiar como sacerdote no lugar de seu pai fará a expiação, havendo posto as vestes de linho, as vestes santas; fará expiação pelo santuário, pela tenda da congregação e pelo altar; também a fará pelos sacerdotes e por todo o povo da congregação. (Levítico 16:30-33)

A obra da expiação anual só poderia favorecer o israelita que obedecesse estritamente às instruções do Senhor concernentes àquele dia. Como se tratava de uma cerimônia repleta de significado, o Dia da Expiação era um dia de descanso completo, ou "um sábado de sábados", o que denota claramente o caráter sagrado da ocasião. Cada pessoa tinha um papel a desempenhar nesse dia, no sentido de afligir a sua alma diante de Deus, isto é, de proceder a um solene exame de consciência para ver se, porventura, não havia ainda algo em sua vida que o privasse de ser aprovado por Deus. Visto que a obra de purificação era completa, abrangente e definitiva para aquele ano, estar em dia com o Senhor era tudo o que importava.

Ademais, somente os pecados confessados durante o ano nos serviços diários poderiam ser expiados pelo sumo sacerdote. Isso implicava que o israelita contrito, que dia após dia havia confessado os seus pecados no santuário, devia a partir de então permanecer no caminho da obediência. Se tal não sucedesse, e se não efetuasse um solene autoexame na presença do Senhor durante a expiação final, todos os pecados pelos quais o santuário havia assumido a responsabilidade recaíam sobre ele, e a consequência era a morte (Ezequiel 18:24; 33:13).

Para aqueles, portanto, cujos pecados permaneciam em aberto e pelos quais o impenitente era responsabilizado só restava "certa expectação horrível de juízo", uma insegurança e temor quase impossíveis de descrever. Uma vez que cada pecado cometido e cada confissão feita sobre os sacrifícios desde o último Dia da Expiação era trazido perante o Senhor e julgado definitivamente, os israelitas aguardavam com profundo interesse e reverência os lances da grande solenidade que decidiria então sua sorte diante de Deus.

Expiação era a obra fundamental que definia o sistema levítico, a nota tônica dos serviços do santuário do princípio ao fim. Em cada etapa das cerimônias típicas se fazia uma expiação pelo pecado. Mas no Dia da Expiação, efetuava-se uma obra final e completa de expiação de todos os pecados confessados ao longo do ano. Nesse dia, tanto o indivíduo como o santuário eram definitivamente purificados; era purificado o indivíduo que durante o ano apresentara seu sacrifício e sobre ele confessado os seus pecados, e o próprio santuário, que assumira a responsabilidade por cada um deles. Uma purificação não poderia acontecer sem a outra. O penitente só seria finalmente vindicado diante de Deus se primeiro o santuário fosse purificado dos registros de pecados confessados.

Ora, essa singularidade do Dia da Expiação - a purificação do tabernáculo e, consequentemente, do povo - não era senão uma sombra da grandiosa obra a realizar-se no santuário celestial na pessoa de nosso Sumo Sacerdote, Jesus Cristo! A Epístola aos Hebreus declara:

Pelo que nem a primeira aliança foi sancionada sem sangue; porque, havendo Moisés proclamado todos os mandamentos segundo a lei a todo o povo, tomou o sangue dos bezerros e dos bodes, com água, e lã tinta de escarlate, e hissopo e aspergiu não só o próprio livro, como também sobre todo o povo, dizendo: Este é o sangue da aliança, a qual Deus prescreveu para vós outros. Igualmente também aspergiu com sangue o tabernáculo e todos os utensílios do serviço sagrado. Com efeito, quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue, e sem derramamento de sangue, não há remissão. Era necessário, portanto, que as figuras das coisas que se acham nos céus se purificassem com tais sacrifícios, mas as próprias coisas celestiais, com sacrifícios a eles superiores. (Hebreus 9:18-23)

O pecado macula tudo aquilo com o qual entra em contato. O sangue é o solvente espiritual que limpa e purifica de toda nódoa de pecado. No sistema levítico, o sangue dos sacrifícios de animais purificava o pecador arrependido com base na promessa de um Messias vindouro. No santuário da nova aliança, o pecador é purificado mediante um sangue infinitamente superior, o sangue de Cristo. Nos serviços do antigo tabernáculo se obtinha a pureza cerimonial, mas no ministério sacerdotal de Cristo em Seu santuário se obtém a pureza moral. O crente pode estar certo que, ao confessar em sincero arrependimento os seus pecados ao Senhor e depositar nEle sua confiança, não só será perdoado, mas também purificado.

Vinde, pois, e arrazoemos, diz o SENHOR; ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a lã. (Isaías 1:18)

Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, mantemos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado. Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça. (I João 1:7-9)

Reconhecer humildemente nossa verdadeira condição é um passo essencial para obter perdão e purificação da parte de Deus. Essa purificação inicial é efetuada pela virtude do sangue de Cristo aplicado à vida e à experiência do crente pela obra intercessora de Cristo em Seu santuário. Aquele que confessa os seus pecados e os abandona certamente alcançará misericórdia (Provérbios 28:13) e será efetivamente perdoado e purificado.

Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós.

Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. (Romanos 8:33-34, 1)

Além da purificação do indivíduo, porém, o santuário terrestre apontava para outra purificação, a do próprio santuário, para o qual os pecados confessados haviam sido figuradamente transferidos e que permaneciam ali até o dia da purificação final no Dia da Expiação. Da mesma forma, no novo concerto, os pecados dos que se arrependeram são, pela fé, assumidos por nosso Senhor Jesus em Seu ministério sacerdotal e transferidos para o Seu santuário. E assim como a purificação típica do santuário terrestre o purificava dos pecados pelos quais assumira a responsabilidade, e que contaminavam os lugares santos, igualmente a purificação efetiva do santuário celeste deve realizar-se pela remoção ou cancelamento definitivo dos pecados ali registrados. É a essa verdade suprema que o autor da Epístola aos Hebreus se refere ao contrastar as coisas celestiais com as terrestres:

Com efeito, quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue, e sem derramamento de sangue, não há remissão. Era necessário, portanto, que as figuras das coisas que se acham nos céus se purificassem com tais sacrifícios, mas as próprias coisas celestiais, com sacrifícios a eles superiores. (Hebreus 9:22-23)

Parece inconcebível que possa existir algo no Céu que deva ser purificado. De fato, não há nada ali que precise ser purificado, exceto os registros de pecados confessados dos pecadores arrependidos que ainda testificam da existência do pecado e que exigem, portanto, uma obra de purificação final que determine o banimento do pecado e de seu originador, e a santificação completa diante do Senhor de todos os que aceitaram as generosas provisões de Sua graça. Ora, não são os pensamentos e atos de cada pessoa, sejam bons ou maus, relatados por Deus com vistas ao juízo (Eclesiastes 12:14)? Não requer essa realidade - a dos registros de pecados no Céu que testificam de sua existência - um tratamento adequado na forma de uma purificação conclusiva a partir do santuário celestial?

Vede que a abertura dos relatórios divinos no Céu, ocasião em que "cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus" (Romanos 14:12), requer uma prestação de contas, um veredito procedente do trono de Deus, quando então os santos que permaneceram ligados à Videira (João 15:4-5) terão os seus pecados eliminados dos livros celestiais, pela virtude do sangue de Cristo, e serão declarados dignos de entrar na cidade de Deus pelas portas (Apocalipse 22:14). O profeta Daniel anteviu essa grandiosa cena em uma visão de tremendo significado para o povo de Deus:

Continuei olhando, até que foram postos uns tronos, e o Ancião de Dias se assentou; sua veste era branca como a neve, e os cabelos da cabeça, como a pura lã; o seu trono eram chamas de fogo, e suas rodas eram fogo ardente. Um rio de fogo manava e saía de diante dele; milhares de milhares o serviam, e miríades de miríades estavam diante dele; assentou-se o tribunal, e se abriram os livros.

Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha com as nuvens do céu um como o Filho do Homem, e dirigiu-se ao Ancião de Dias, e o fizeram chegar até ele. Foi-lhe dado domínio, e glória, e o reino, para que os povos, nações e homens de todas as línguas o servissem; o seu domínio é domínio eterno, que não passará, e o seu reino jamais será destruído. (Daniel 7:9-10, 13-14)

Mais adiante, Daniel testifica que esse juízo a ter lugar nas cortes celestes é a favor dos santos do Altíssimo, a fim de que possam possuir o reino eterno de Deus e viver para sempre com Ele (Daniel 7:16-18, 21-22, 25-27). A obra final de julgamento deve, assim, efetuar uma purificação completa, santificando cabalmente os seguidores de Jesus e condenando o pecado à sua total erradicação, de maneira que não haja mais nenhum vestígio de sua presença que possa contaminar o santuário ou o povo de Deus.

Salvação, com efeito, envolve mais do que perdão. Ela requer o banimento do pecado até o seu último limite, de modo que haja completa purificação e total restauração de todas as coisas que o pecado danificou. A purificação do santuário celestial envolve, pois, uma obra de investigação de cada caso, um julgamento final e conclusivo em seus resultados, que purifique definitivamente o próprio santuário da presença dos registros de pecados confessados e os deposite sobre a cabeça de seu originador, Satanás. Assim, em Seu ministério sacerdotal no santuário celestial, Cristo efetua uma obra de salvação e reconciliação completa, que traz purificação final e total erradicação do pecado, para a glória de Deus e benefício de Suas criaturas.

Ellen G. White, referindo-se ao cumprimento do Dia da Expiação típico no ministério sumo sacerdotal de Cristo no Céu, escreve o seguinte em Patriarcas e Profetas, p. 357 e 358:

No grande dia da paga final, os mortos devem ser "julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras". Apoc. 20:12. Então, pela virtude do sangue expiatório de Cristo, os pecados de todo o verdadeiro arrependido serão eliminados dos livros do Céu. Assim o santuário estará livre ou purificado, do registro de pecado. No tipo, esta grande obra de expiação, ou cancelamento de pecados, era representada pelas cerimônias do dia da expiação, a saber, pela purificação do santuário terrestre, a qual se realizava pela remoção dos pecados com que ele ficara contaminado, remoção efetuada pela virtude do sangue da oferta para o pecado.

Assim como na expiação final os pecados dos verdadeiros arrependidos serão apagados dos registros do Céu, para não mais serem lembrados nem virem à mente, assim no serviço típico eram levados ao deserto, para sempre separados da congregação.

Visto que Satanás é o originador do pecado, o instigador direto de todos os pecados que ocasionaram a morte do Filho de Deus, exige a justiça que Satanás sofra a punição final. A obra de Cristo para a redenção dos homens e purificação do Universo da contaminação do pecado, encerrar-se-á pela remoção dos pecados do santuário celestial e deposição dos mesmos sobre Satanás, que cumprirá a pena final. Assim no cerimonial típico, o ciclo anual do ministério encerrava-se com a purificação do santuário e confissão dos pecados sobre a cabeça do bode emissário. Em tais condições, no ministério do tabernáculo e do templo que mais tarde tomou o seu lugar, ensinavam-se ao povo cada dia as grandes verdades relativas à morte e ministério de Cristo, e uma vez ao ano sua mente era transportada para os acontecimentos finais do grande conflito entre Cristo e Satanás, e para a final purificação do Universo, de pecado e pecadores.

O senso de urgência que envolve a necessidade de reavivamento e reforma entre o professo povo de Deus deve refletir a suprema realidade do ministério final de Cristo em Seu santuário. Para esse portentoso evento convergem as mais importantes profecias escatológicas da Bíblia, e o próprio livro do Apocalipse, a revelação de nosso amado Salvador, é estruturado a partir da perspectiva da obra de nosso grande Sumo Sacerdote no santuário celestial.

Em vista da crescente polarização no mundo entre a verdade e o erro, de um reajustamento radical de todo pensamento e vida, seja em torno da obediência aos mandamentos de Deus, seja pela rejeição de seus princípios em favor de uma moralidade mais humanista, nós precisamos nos perguntar se estamos preparados para comparecer e permanecer diante de Deus quando nosso livro de registro for aberto no tribunal celeste.

À igreja representada por Laodiceia, cujo nome significa "o povo julgado", Cristo se apresenta como "a testemunha fiel e verdadeira" (Apocalipse 3:14), uma qualidade coerente com o seu papel no santuário celestial. A despeito da avaliação que os laodiceanos fazem de si mesmos (verso 17), se pode confiar no testemunho de Cristo com respeito à nossa verdadeira condição. Ele não falará nada mais do que a verdade, e nessa obra investigativa, a exemplo do Dia da Expiação típico, não haverá desculpas nem subterfúgios quanto às nossas responsabilidades perante Deus.

No entanto, Cristo está próximo de seus seguidores, mesmo quando a condição deles não é favorável. Nosso Sumo Sacerdote não é um Juiz arbitrário que deseja acusar e condenar, mas redimir e salvar! A obra final de expiação que Ele realiza no Céu, uma obra de julgamento, visa beneficiar o Seu povo, não condená-lo. Por isso, Cristo aconselha (Apocalipse 3:18), repreende (verso 19) e apela à porta do nosso coração (verso 20). Se respondermos positivamente ao Seu chamado, não haverá razão para temer o juízo.

Mas há aqui um custo que precisa ser satisfeito, e que era ensinado pelo Dia da Expiação levítico. Embora nosso Redentor esteja empenhado em despertar-nos de nossa letargia espiritual, Sua obra de expiação final no Céu exige de cada um de nós um autoexame, uma solene e profunda investigação de nosso íntimo, a fim de verificar como estamos diante de Deus. Nada pode ser mais importante, especialmente pelo fato de vivermos no Dia da Expiação antitípico. Não é tempo de subestimar ou relevar o pecado, nem tampouco o de contentar-nos com nossa própria justiça. Necessitamos afligir a nossa alma na presença do Senhor e cooperar com Ele para o desenvolvimento de nossa salvação com temor e tremor (Filipenses 2:12), se não quisermos ser encontrados em falta.

Continuaremos tratando desse solene assunto em nossa próxima postagem, se Deus assim o permitir.

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